Reforma
íntima, já!
“E disse-lhes: Por que
estais dormindo?
Levantai-vos e orai para
que não entreis em
tentação”.¹
No Monte das Oliveiras,
o crepúsculo anunciava a
chegada da noite,
momento sublime
convidando à meditação.
Jesus, na companhia de
Simão Pedro, João e
Tiago, alcançou o monte
para viver a derradeira
hora com os discípulos
amados. Sabia que ali
mesmo seria preso,
sentenciado e condenado
ao calvário.
Solicitou o Mestre aos
companheiros que
permanecessem em oração
e vigilância, junto com
ele, para que tivesse a
glorificação de Deus no
supremo
testemunho.Afastou-se e,
colocando-se em prece, a
pequena distância, pôde
ser observado em toda
sua sublimidade por
aqueles corações que o
ouviam e amavam.
Narra Lucas¹ que, sem
motivo que pudesse ser
explicado, os três
adormeceram no decurso
da oração, enquanto
Jesus orava
fervorosamente, mesmo
diante de tão grande dor
que se avizinhava.
Pensemos um pouco: O
sono, conhecido por nós,
é necessário para o
refazimento das nossas
energias físicas. Ele é
indispensável à vida
humana a fim de
restaurarmos as
condições orgânicas para
a continuação da nossa
vida material.
Obviamente,o ensino de
Jesus não se referia a
ele.
Essa passagem evangélica
remete-nos, assim, a
duas reflexões que devem
ser expostas por estarem
ligadas à nossa condição
atual de eternos
aprendizes da Sabedoria
Divina.A primeira é uma
chamada à
conscientização das
tarefas que estão sob
nossos cuidados. Diz
Emmanuel² que o aprendiz
do Evangelho deve ser “o
campo de trabalho do
Reino, onde se
esforçará, operoso e
vigilante, compreendendo
que o Cristo prossegue
em serviço redentor para
o resgate total das
criaturas” – “Nenhuma
das ovelhas de meu Pai
se perderá”.
Todavia, não ignoramos a
presença de inúmeros
companheiros – e quantas
vezes nós próprios! –com
atividades alicerçadas
nos ensinamentos
cristãos,a permanecerem
dormindo nas
conveniências pessoais,
geralmente ligadas a
interesses mesquinhos,
nas vaidades efêmeras.Os
chamamentos transitórios
iludem-nos e fazem com
que o tempo seja gasto
em futilidades.
Malbaratamos as
oportunidades valiosas
que nos são oferecidas
para nosso crescimento
espiritual e
permanecemos voltados
apenas para as questões
pessoais que nos afetam
o cotidiano.
O Mestre fala, então, de
um sono diferente.
Refere-se o Excelso
Amigo ao sono da
indiferença, do descaso,
do comodismo, da
invigilância, diante dos
deveres que nos
competem.
Com propriedade, ainda,
lembra Emmanuel que
“falam do Cristo,
referem-se à sua
imperecível
exemplificação, como se
fossem sonâmbulos
inconscientes do que
dizem e do que fazem,
para despertarem tão só
no instante da morte
corporal, em soluções
tardias”.²Somos os
discípulos de hoje que
esquecem o mandato do
qual somos portadores,
que se inquietam pela
rápida execução dos seus
desejos e caprichos,
procurando aproveitar
cada momento da
existência como se fosse
o último, acreditando
que os dias correm
depressa demais, sem
tempo para tantos
prazeres materiais a
serem experimentados.
Esquecemos que a vida é
eterna e que o tempo no
corpo físico, ante essa
eternidade, é quase
nada. E ao despertarmos
no mundo espiritual,
obreiros distraídos que
somos, os trabalhadores
ausentes de suas
obrigações, sob a
cobrança das próprias
consciências, choramos e
clamamos pelo reencontro
da paz do Cristo. “A
minha paz vos dou. Não a
paz do mundo, mas a
minha paz.”
Assim, como Jesus, ao
ver os discípulos
dormindo, lhes disse:
“Por que estais
dormindo? Levantai-vos e
orai para que não
entreis em tentação”,
também o discípulo
invigilante ouve, nos
refolhos da sua
consciência, a voz do
Senhor dizendo a Pedro:
“Então, nem por uma
hora pudeste velar
comigo?” ³. E se
não conseguimos, ainda,
permanecer uma hora com
o Cristo, na prática dos
seus ensinamentos, como
pretender a união com
Ele para sempre?
Todo cristão sabe que a
Terra só se libertará do
império do mal se todos
nós, trabalhadores do
bem, ajudarmos Jesus com
nossos recursos. Mas,
para que isso ocorra,
Ele precisa de
auxiliares que cumpram
seus deveres, nas
atividades diárias e
justas, como exemplos
vivos, dando testemunhos
em toda parte.
Somos, meus irmãos, os
Lázaros modernos a quem
o Cristo chama: Acorda!
Levanta! Sai!
Acorda para a
consciência de que és um
ser espiritual, imortal,
criado por Deus para
viver na plenitude do
Seu Amor.
Levanta dessa ociosidade
que te prende às algemas
materiais, que te limita
a mente e te engessa no
passado.
Sai do egoísmo que te
bitola a visão do cosmo
e te faz imaginar que és
o centro do Universo.
Sai do “eu” fantasioso e
amplia a mente para tudo
que esteja ao teu redor,
seja estrela, seja
homem.
Abandona a velha
estrutura que te mantém
atado a valores antigos
de cor, religião,
posição social, e
entrega-te a Deus, como
ser cósmico que és,ser
divino com luz própria e
infinitas capacidades de
voar para a felicidade
plena.
Meus irmãos, Jesus
desceu à Terra para
deixar uma mensagem que
tem, na sua essência, um
alerta à necessidade de
transformação das nossas
predisposições íntimas,
em relação à vida, com
vistas ao nosso
aprimoramento moral e
espiritual.
Sem essa modificação,
ficaremos, simplesmente,
estacionados nos
caminhos da vida,
convivendo e praticando
todas as espécies de
vícios, de
desregramentos,
endurecendo nossos
corações aos
ensinamentos benditos.
E o maior problema que
enfrentamos com esse
sono da alma é a nossa
imensa disponibilidade
para as coisas materiais
e a total falta de
tempo, vontade,
interesse, de
disposição, de jeito
para as coisas do
Espírito. Com uma vida
repleta de contradições,
com diferentes tipos de
sentimentos negativos a
fazer morada em nós, é
esperado que nos
defrontaremos na vida
espiritual, quando
deixarmos o corpo
físico, com as
dificuldades de não
termos amealhado os
tesouros imperecíveis do
céu: valores morais,
valores perenes.
Dissemos que havia duas
reflexões sobre a
narrativa de Lucas e
Mateus. Vamos encontrar
a segunda, num conto de
grande beleza,de
Humberto de Campos.4
Diz o querido Instrutor
Espiritual que, após o
episódio do Horto das
Oliveiras, onde dormira
com seus companheiros –
não atendendo ao pedido
de Jesus para a oração e
a vigilância –, no
momento em que o coração
amoroso do Mestre mais
necessitava de
assistência e afeto,
João, o filho de
Zebedeu, implorava, em
lágrimas, que Ele
perdoasse seu descuido
da hora extrema.
“Certa noite, após as
reflexões costumeiras,
sentiu ele que um sono
brando lhe anestesiava
os centros vitais. Como
numa atmosfera de sonho,
verificou que o Mestre
se aproximava. (...)
Precedendo suas palavras
do sereno sorriso dos
tempos idos, disse-lhe
Jesus:
– João, a minha soledade
no horto é também um
ensinamento do Evangelho
e uma exemplificação!
Ela significará, para
quantos vierem em nossos
passos, que cada
Espírito na Terra tem de
ascender sozinho ao
calvário de sua
redenção, muitas vezes
com a despreocupação dos
entes mais amados no
mundo. Em face dessa
lição, o discípulo do
futuro compreenderá que
a sua marcha tem que ser
solitária, uma vez que
seus familiares e
companheiros de
confiança se entregam ao
sono da indiferença!
Doravante, pois,
aprendendo a necessidade
do valor individual no
testemunho, nunca
deixes de orar e
vigiar!...” 4
Assim, necessário se faz
que, enquanto nos
encontrarmos no corpo
físico, não durmamos em
espírito, desatentos aos
convites de Jesus. É
fundamental para nossa
proteção e sustentação
que nos levantemos e nos
esforcemos, porque é “no
sono da alma que se
encontram as mais
perigosas tentações,
através de pesadelos ou
fantasias”.²
Bibliografia:
Texto de apoio para a
palestra – Quando
Jesus teria sido maior?
– Paulo Alves Godoy, 2ª
ed., FEESP Editora -
Reforma Íntima, Já! 1990
– p. 133
1 – Lucas, 22:46.
2 – EMMANUEL (Espírito)
– Caminho Verdade e
Vida – [psicografado
por] F.C.Xavier –
FEB-Rio de Janeiro/RJ –
17ª ed., 1997 – Lições
87 e 88.
3 – Mateus, 26:40.
4 – CAMPOS, Humberto de
(Espírito) – Boa Nova–[psicografado
por] F.C.Xavier –FEB –
Rio de Janeiro/RJ – 25ª
ed., 1999 – Cap. 27.