EURÍPEDES KÜHL
euripedes.kuhl@terra.com.br
Ribeirão Preto,
SP (Brasil)
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Três
alegorias: a
Caverna, o
Peixinho e o
Caminho
Alegoria é a
exposição de um
pensamento sob
forma figurada;
ficção que
representa uma
coisa para dar
ideia de outra:
sequência de
metáforas que
significam uma
coisa nas
palavras e outra
no sentido.
–
(Novo Dicionário
FOLHA/AURÉLIO,
Folha de S.
Paulo – 1995.)
1ª Alegoria:
Mito da Caverna
(Platão)
O que é o mito -
O Mito da
Caverna, também
conhecido como
“Alegoria da
Caverna” é uma
passagem do
livro “A
República” do
filósofo grego
Platão. É mais
uma alegoria do
que propriamente
um mito. É
considerada uma
das mais
importantes
alegorias da
história da
Filosofia.
Através desta
metáfora é
possível
conhecer uma
importante
teoria
platônica: como,
através do
conhecimento, é
possível captar
a existência do
mundo sensível
(conhecido
através dos
sentidos) e do
mundo
inteligível
(conhecido
somente através
da razão).
O mito fala
sobre
prisioneiros
(desde o
nascimento) que
vivem presos em
correntes numa
caverna e que
passam todo
tempo olhando
para a parede do
fundo que é
iluminada pela
luz gerada por
uma fogueira.
Nesta parede são
projetadas
sombras de
estátuas
representando
pessoas,
animais, plantas
e objetos,
mostrando cenas
e situações do
dia a dia. Os
prisioneiros
ficam dando
nomes às imagens
(sombras),
analisando e
julgando as
situações.
Vamos imaginar
que um dos
prisioneiros
fosse forçado a
sair das
correntes para
poder explorar o
interior da
caverna e o
mundo externo.
Entraria em
contato com a
realidade e
perceberia que
passou a vida
toda analisando
e julgando
apenas imagens
projetadas por
estátuas. Ao
sair da caverna
e entrar em
contato com o
mundo real
ficaria
encantado com os
seres de
verdade, com a
natureza, com os
animais etc.
Voltaria para a
caverna para
passar todo
conhecimento
adquirido fora
da caverna para
seus colegas
ainda presos.
Porém, seria
ridicularizado
ao contar tudo o
que viu e
sentiu, pois
seus colegas só
conseguem
acreditar na
realidade que
enxergam na
parede iluminada
da caverna. Os
prisioneiros vão
o chamar de
louco,
ameaçando-o de
morte caso não
pare de falar
daquelas ideias
consideradas
absurdas.
O
que Platão quis
dizer com o mito
- Os seres
humanos têm uma
visão distorcida
da realidade. No
mito, os
prisioneiros
somos nós que
enxergamos e
acreditamos
apenas em
imagens criadas
pela cultura,
conceitos e
informações que
recebemos
durante a vida.
A caverna
simboliza o
mundo, pois nos
apresenta
imagens que não
representam a
realidade. Só é
possível
conhecer a
realidade,
quando nos
libertamos
destas
influências
culturais e
sociais, ou
seja, quando
saímos da
caverna.
2ª
Alegoria
–
A lenda do
“Peixinho
Vermelho”
(Introdução do
livro
“Libertação”, do
Espírito André
Luiz,
psicografia de
F. C. Xavier,
Ed. FEB.)
No centro de
formoso jardim,
havia grande
lago, adornado
de ladrilhos
azul-turquesa.
Alimentado por
diminuto canal
de pedra,
escoava suas
águas, do outro
lado, através de
grade muito
estreita. Nesse
reduto
acolhedor, vivia
toda uma
comunidade de
peixes, a se
refestelarem,
nédios e
satisfeitos, em
complicadas
locas, frescas e
sombrias.
Elegeram um dos
concidadãos de
barbatanas para
os encargos de
rei, e ali
viviam,
plenamente
despreocupados,
entre a gula e a
preguiça.
Junto deles,
porém, havia um
peixinho
vermelho,
menosprezado de
todos. Não
conseguia pescar
a mais leve
larva, nem
refugiar-se nos
nichos
barrentos. Os
outros, vorazes
e gordalhudos,
arrebatavam para
si todas as
formas larvárias
e ocupavam,
displicentes,
todos os lugares
consagrados ao
descanso.
O peixinho
vermelho que
nadasse e
sofresse. Por
isso mesmo era
visto, em
correria
constante,
perseguido pela
canícula ou
atormentado de
fome. Não
encontrando
pouso no
vastíssimo
domicílio, o
pobrezinho não
dispunha de
tempo para muito
lazer e começou
a estudar com
bastante
interesse.
Fez o inventário
de todos os
ladrilhos que
enfeitavam as
bordas do poço,
arrolou todos os
buracos nele
existentes e
sabia, com
precisão, onde
se reuniria
maior massa de
lama por ocasião
de aguaceiros.
Depois de muito
tempo, à custa
de longas
perquirições,
encontrou a
grade do
escoadouro. À
frente da
imprevista
oportunidade de
aventura
benéfica
refletiu
consigo:
— “Não será
melhor pesquisar
a vida e
conhecer outros
rumos?”.
Optou pela
mudança.
Apesar de
macérrimo pela
abstenção
completa de
qualquer
conforto, perdeu
várias escamas,
com grande
sofrimento, a
fim de
atravessar a
passagem
estreitíssima.
Pronunciando
votos
renovadores
avançou,
otimista, pelo
rego d’água,
encantado com as
novas paisagens,
ricas de flores
e sol que o
defrontavam, e
seguiu,
embriagado de
esperança... Em
breve alcançou
grande rio e fez
inúmeros
conhecimentos.
Encontrou peixes
de muitas
famílias
diferentes, que
com ele
simpatizaram,
instruindo-o
quanto aos
percalços da
marcha e
descortinando-lhe
mais fácil
roteiro.
Embevecido,
contemplou nas
margens homens e
animais,
embarcações e
pontes, palácios
e veículos,
cabanas e
arvoredo.
Habituado com o
pouco, vivia com
extrema
simplicidade,
jamais perdendo
a leveza e a
agilidade
naturais.
Conseguiu, desse
modo, atingir o
oceano, ébrio de
novidade e
sedento de
estudo. De
início, porém,
fascinado pela
paixão de
observar,
aproximou-se de
uma baleia para
quem toda a água
do lago em que
vivera não seria
mais que
diminuta ração;
impressionado
com o
espetáculo,
abeirou-se dela
mais que devia e
foi tragado com
os elementos que
lhe constituíam
a primeira
refeição diária.
Em apuros, o
peixinho aflito
orou ao Deus dos
Peixes, rogando
proteção no bojo
do monstro e,
não obstante as
trevas em que
pedia
salvamento, sua
prece foi
ouvida, porque o
valente cetáceo
começou a
soluçar e
vomitou,
restituindo-o às
correntes
marinhas.
O pequeno
viajante,
agradecido e
feliz, procurou
companhias
simpáticas e
aprendeu a
evitar os
perigos e
tentações.
Plenamente
transformado em
suas concepções
do mundo, passou
a reparar as
infinitas
riquezas da
vida. Encontrou
plantas
luminosas,
animais
estranhos,
estrelas móveis
e flores
diferentes no
seio das águas.
Sobretudo,
descobriu a
existência de
muitos
peixinhos,
estudiosos e
delgados tanto
quanto ele,
junto dos quais
se sentia
maravilhosamente
feliz.
Vivia, agora,
sorridente e
calmo, no
Palácio de Coral
que elegera, com
centenas de
amigos, para
residência
ditosa, quando,
ao se referir ao
seu começo
laborioso, veio
a saber que
somente no mar
as criaturas
aquáticas
dispunham de
mais sólida
garantia, de vez
que, quando o
estio se fizesse
mais arrasador,
as águas de
outra altitude
continuariam a
correr para o
oceano.
O peixinho
pensou,
pensou... E
sentindo imensa
compaixão
daqueles com
quem convivera
na infância,
deliberou
consagrar-se à
obra do
progresso e
salvação deles.
Não seria justo
regressar e
anunciar-lhes a
verdade? Não
seria nobre
ampará-los,
prestando-lhes a
tempo valiosas
informações?
Não hesitou.
Fortalecido pela
generosidade de
irmãos
benfeitores que
com ele viviam
no Palácio de
Coral,
empreendeu
comprida viagem
de volta. Tornou
ao rio, do rio
dirigiu-se aos
regatos e dos
regatos se
encaminhou para
os canaizinhos
que o conduziram
ao primitivo
lar. Esbelto e
satisfeito como
sempre, pela
vida de estudo e
serviço a que se
devotava, varou
a grade e
procurou,
ansiosamente, os
velhos
companheiros.
Estimulado pela
proeza de amor
que efetuava,
supôs que o seu
regresso
causasse
surpresa e
entusiasmo
gerais. Certo, a
coletividade
inteira lhe
celebraria o
feito, mas
depressa
verificou que
ninguém se
mexia. Todos os
peixes
continuavam
pesados e
ociosos,
repimpados nos
mesmos ninhos
lodacentos,
protegidos por
flores de lótus,
de onde saíam
apenas para
disputar larvas,
moscas ou
minhocas
desprezíveis.
Gritou que
voltara a casa,
mas não houve
quem lhe
prestasse
atenção,
porquanto
ninguém, ali,
havia dado pela
ausência dele.
Ridicularizado,
procurou, então,
o rei de guelras
enormes e
comunicou-lhe a
reveladora
aventura.
O soberano, algo
entorpecido pela
mania de
grandeza, reuniu
o povo e
permitiu que o
mensageiro se
explicasse. O
benfeitor
desprezado,
valendo-se do
ensejo,
esclareceu, com
ênfase, que
havia outro
mundo líquido,
glorioso e
sem-fim. Aquele
poço era uma
insignificância
que podia
desaparecer, de
momento para
outro. Além do
escoadouro
próximo
desdobravam-se
outra vida e
outra
experiência. Lá
fora, corriam
regatos ornados
de flores, rios
caudalosos
repletos de
seres diferentes
e, por fim, o
mar, onde a vida
aparece cada vez
mais rica e mais
surpreendente.
Descreveu o
serviço de
tainhas e
salmões, de
trutas e
esqualos. Deu
notícias do
peixe-lua, do
peixe-coelho e
do galo-do-mar.
Contou que vira
o céu repleto de
astros sublimes
e que descobrira
árvores
gigantescas,
barcos imensos,
cidades
praieiras,
monstros
temíveis,
jardins
submersos,
estrelas do
oceano e
ofereceu-se para
conduzi-los ao
Palácio de
Coral, onde
viveriam todos,
prósperos e
tranquilos.
Finalmente os
informou de que
semelhante
felicidade,
porém, tinha
igualmente seu
preço. Deveriam
todos emagrecer,
convenientemente,
abstendo-se de
devorar tanta
larva e tanto
verme nas locas
escuras e
aprendendo a
trabalhar e
estudar tanto
quanto era
necessário à
venturosa
jornada.
Assim que
terminou,
gargalhadas
estridentes
coroaram-lhe a
preleção.
Ninguém
acreditou nele.
Alguns oradores
tomaram a
palavra e
afirmaram,
solenes, que o
peixinho
vermelho
delirava, que
outra vida além
do poço era
francamente
impossível, que
aquela história
de riachos, rios
e oceanos era
mera fantasia de
cérebro demente
e alguns
chegaram a
declarar que
falavam em nome
do Deus dos
Peixes, que
trazia os olhos
voltados para
eles unicamente.
O soberano da
comunidade, para
melhor ironizar
o peixinho,
dirigiu-se em
companhia dele
até à grade de
escoamento e,
tentando, de
longe, a
travessia,
exclamou,
borbulhante:
— “Não vês que
não cabe aqui
nem uma só de
minhas
barbatanas?
Grande tolo!
Vai-te daqui!
Não nos
perturbes o
bem-estar...
Nosso lago é o
centro do
Universo...
Ninguém possui
vida igual à
nossa!”.
Expulso a golpes
de sarcasmo, o
peixinho
realizou a
viagem de
retorno e
instalou-se, em
definitivo, no
Palácio de
Coral,
aguardando o
tempo.
Depois de alguns
anos, apareceu
pavorosa e
devastadora
seca. As águas
desceram de
nível. E o poço
onde viviam os
peixes
pachorrentos e
vaidosos
esvaziou-se,
compelindo a
comunidade
inteira a
perecer, atolada
na lama...
3ª Alegoria - Útmutató
a Léleknek
Útmutató a
Léleknek, em
húngaro =
“Caminho (Guia)
para a alma”.
(út = caminho;
mutató = que
mostra; lélek =
alma; léleknek =
para a alma.)
No ventre de uma
mãe havia dois
bebês. Um
perguntou ao
outro: "Você
acredita em vida
após o parto?"
O outro
respondeu: "É
claro. Tem que
haver algo após
o parto. Talvez
nós estejamos
aqui para nos
prepararmos para
o que virá mais
tarde".
"Bobagem", disse
o primeiro. "Não
há vida após o
parto. Que tipo
de vida seria
esta?"
O segundo disse:
"Eu não sei, mas
haverá mais luz
do que aqui.
Talvez nós
possamos andar
com as nossas
próprias pernas
e comer com
nossas bocas.
Talvez tenhamos
outros sentidos
que não podemos
entender agora".
O primeiro
retrucou: "Isto
é um absurdo.
Andar é
impossível. E
comer com a
boca!? Ridículo!
O cordão
umbilical nos
fornece nutrição
e tudo o mais de
que precisamos.
O cordão
umbilical é
muito curto. A
vida após o
parto está fora
de cogitação".
O segundo
insistiu: "Bem,
eu acho que há
alguma coisa e
talvez seja
diferente do que
é aqui. Talvez a
gente não vá
mais precisar
deste tubo
físico".
O primeiro
contestou:
"Bobagem, e além
disso, se há
realmente vida
após o parto,
então, por que
ninguém jamais
voltou de lá? O
parto é o fim da
vida e no
pós-parto não há
nada além de
escuridão,
silêncio e
esquecimento.
Ele não nos
levará a lugar
nenhum".
"Bem, eu não
sei", disse o
segundo, "mas
certamente vamos
encontrar a
Mamãe e ela vai
cuidar de nós."
O primeiro
respondeu:
"Mamãe, você
realmente
acredita em
Mamãe? Isto é
ridículo. Se a
Mamãe existe,
então, onde ela
está agora?"
O segundo disse:
"Ela está ao
nosso redor.
Estamos cercados
por ela. Nós
somos dela. É
nela que
vivemos. Sem ela
este mundo não
seria e não
poderia
existir".
Disse o
primeiro: "Bem,
eu não posso
vê-la, então, é
lógico que ela
não existe".
Ao que o segundo
respondeu: "Às
vezes, quando
você está em
silêncio, se
você se
concentrar e
realmente ouvir,
você poderá
perceber a
presença dela e
ouvir sua voz
amorosa lá de
cima".
Nota do Autor:
Em alguns sites
a alegoria acima
aparece sendo da
autoria do
escritor húngaro
Útmutató a
Léleknek.
Contudo, como em
húngaro essas
palavras
significam “Guia
para a alma”,
não tenho como
comprovar essa
autoria,
parecendo-me
mais como uma
lenda húngara.