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Crônicas e Artigos
Ano 1 - N° 35 - 16 de Dezembro de 2007

EUGÊNIA PICKINA 
eugeniamva@yahoo.com.br 
Londrina, Paraná (Brasil)
 

Tristeza: sentimento e recurso

Um dos passos essenciais em direção à alegria é claramente não negar a própria realidade de imperfeições, pois a paciência em relação a si mesmo é sinal da confiança na determinante evolutiva.

Aceitar o compromisso de educar-se para uma vida com qualidade (distinta de uma vida com quantidade), embora intrínseca seja a presença da falibilidade, sugere o entendimento de que se a dor aparecer, certamente cada um de nós disporá de instrumentos internos para atravessá-la com a maior dignidade possível, ao menos, pois erros e fracassos participam da trama do crescimento interior.

Cada um tem uma maneira singular de encarnar a inteligência e expressar seus dons e potencialidades. Logo, é uma falta de senso imitar ou comparar-se. Sempre ouvi dizer que aquele que insiste na comparação se inclina ao enfraquecimento, pois embota sua forma particular de ser e, com isso, dá munição para uma vida que não consegue oferecer-se e, esclerosada, tende a orientar lamúrias e amarguras...

Marcus Quintaes explica que o “sujeito triste é aquele que tem sua potência de ação enfraquecida e diminuída”.  Desse modo, a tristeza é resultante de uma insatisfação pessoal ligada a uma área emocional específica e que, desse modo, pode sinalizar um espaço de reflexão e, em conseqüência, conduzir a uma transformação positiva, segundo uma ética da alegria, que pressupõe o fortalecimento do ser em todas as suas manifestações e trocas.

O triste é exigente de um retiro. E o retiro é um ato de força. É no retiro que se consegue preparar uma base sólida para um novo tempo de sentimentos e ações profícuas. Esse momento de solidão reflexiva permite um novo ponto de partida, pois aquele que pára, imbuído do propósito de meditar sobre a tristeza que impregna determinado locus da sua existência, poderá entender que algo precisa ser feito para corrigir uma atitude equivocada ou modificar um relacionamento desajustado, o que sugere uma visita a sentimentos exigentes de um entendimento mais condizente com o ser interno, e não externo.

Ora, somente o próprio indivíduo pode decidir transformar o estado de melancolia em exaltação, à medida que aceita o sentimento lúgubre, investiga-o e procura, a partir de um auto-exame sincero, experimentar mudanças ou o uso de chaves novas para fortalecer e aprimorar sua auto-expressão a serviço de si mesmo e do social.

Sentir a dor da existência é demasiado humano. No entanto, o problema pode se tornar crônico, quando, por exemplo, a pessoa se infiltra na dor e, fixada, decida não fazer a travessia, pois mesmo o luto conhece um fim e a atitude de cuidar da própria casa é responsabilidade de cada um.

Embotar-se indefinidamente e recusar despertar de um esgotamento cinzento pode levar o indivíduo a enxergar sua trilha apenas nos estreitos limites do abatimento. Emparedada na melancolia, a pessoa conviverá intimamente com paisagens nebulosas e, com isso, alimentará o sentimento opaco, atestante da assertiva de Emmanuel: “Se preferes a tristeza, anotarás o desalento, em cada trecho do caminho”.

Noutra direção, positiva, a tristeza pode instruir a busca de novas respostas, desde que o sujeito procure um intervalo meditativo para enfrentar o desafio da auto-análise. E se perdas e sofrimentos não são evitáveis, pois participam da vida dinâmica, encará-los reclama de nós não uma estada neles, mas sim a descoberta de meios de atravessá-los para dar seguimento às nossas jornadas evolutivas, que pedem, às vezes, somente um passo a mais...

Todos os atos da vida podem fornecer pistas preciosas se tratados de maneira respeitosa. Melancolias ligadas à privacidade ou a compromissos sociais podem ter efeitos limitadores na manifestação individual. Se este é o caso, é preciso meditar sobre as áreas emocionais cuja alegria está minguada para conseguir seguir em frente munido de novas energias, pois a presença em nós de um sentimento negativo, se não localizado e investigado, pode bloquear nossa relação com a própria vida e com os nossos semelhantes.

A tristeza reclama o desafio do discernimento. O triste pode fazer uso, a seu favor, do examinar para transformar, muitas vezes, um agir local mecanicista e alienado. Quando compreendemos a falta de sentido de nossas ações (ou inações), somos capazes de nos reorientar de forma saudável. Além disso, à medida que nos predispomos a extrair do desalento algo sobre nós mesmos e entendemos o que nos faz embotados, nos damos a chance de sair do inferno mental, que significa tão-somente estar encapsulado, fechado às belezas e bênçãos do caminho.

Desse modo, caso sinta a tristeza eclodir, experimente parar, analisar, questionar, descobrir respostas... Não duvide: caso seu processo melancólico seja superado, dar-lhe-á, como pista, uma nova compreensão sobre si mesmo e sobre o seu entorno. Dessa maneira, valorize o princípio criativo que trazemos em nós, pois, como o Pai, somos seres criadores o que quer que se passe dentro de nosso ser se espalha pelo mundo, refletindo esmorecimento ou alegria frente a todas as outras manifestações de vida. 
 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita