WILSON CZERSKI
wilsonczerski@brturbo.com.br
Curitiba, Paraná
(Brasil)
As cartas psicografadas
como prova nos tribunais
Há algum tempo, o
programa
“Linha Direta – Justiça”,
da Rede Globo
de Televisão, apresentou
alguns casos envolvendo
a
comunicação dos
Espíritos
pelo
falecido
médium Chico Xavier
como argumento de
defesa para três réus
acusados de assassinato.
Os dois primeiros
ocorreram em Goiânia em
1976, com intervalo de
três meses, e o último
em Mato Grosso do Sul,
nove anos mais tarde.
No caso pioneiro, o juiz
Orimar de Bastos,
interpretado no programa
de maneira algo
caricata, datilografou a
sentença em três horas,
segundo suas próprias
palavras, quase
inconscientemente.
Somente ao lê-la, ao
final, tomou
conhecimento dos
argumentos utilizados
para absolver o réu, um
empresário acusado de
matar Henrique Manoel
Gregóris, no dia 10 de
fevereiro de 1976, ao
disparar acidentalmente
contra o amigo enquanto
se divertiam em
companhia de mulheres. A
mãe da vítima foi
dissuadida de recorrer
da sentença após uma
visita do médium mineiro
a sua casa, o qual lhe
afirmou ter recebido tal
pedido direto do
Espírito do filho.
Tempos depois, a família
recebeu também algumas
cartas de Henrique
psicografadas por Chico
Xavier,
falando de seu estado
atual, reafirmando a
inocência do ex-réu e
agradecendo pela decisão
tomada de desistir do
recurso.
Em maio daquele ano, o
mesmo juiz foi
encarregado de julgar um
caso parecido.
Angustiada, a família
vitimada foi visitada
pela mãe do rapaz morto
no caso anterior que lhe
trouxe livros de Chico
Xavier. Nas cartas
recebidas pelo médium em
Uberaba,
a assinatura
correspondia à constante
na carteira de
identidade de Maurício e
estas foram decisivas
para a absolvição do
réu.
Num encontro que teve
mais tarde com Chico
Xavier, o juiz dos dois
casos também recebeu uma
carta escrita por um
conhecido juiz local,
desencarnado há vários
anos, que lhe explicou a
importância daqueles
fatos como prova da
imortalidade das almas e
da possibilidade de
estas se comunicarem com
os chamados vivos.
Outras 14 autoridades
desencarnadas em Goiânia
compunham a equipe que
trabalhava para que os
casos alcançassem
notoriedade.
Em 1985, a
ex-miss Campo Grande
Gleide Maria Dutra foi
morta pelo bancário João
Francisco de Deus.
Liberado por um
habeas corpus, ele
procurou Chico Xavier e
o Espírito da esposa
também se comunicou, em
três cartas,
inocentando-o,
a primeira delas 47 dias
após sua morte. Na
revisão da pena o réu
foi apenado com um ano
de prisão que nem chegou
a cumprir porque o crime
já havia prescrito. À
filha do novo
matrimônio, João deu o
nome da ex-esposa.
O programa trouxe, além
das opiniões de juristas
e outras pessoas que se
posicionaram quanto à
autenticidade e validade
de uso deste tipo de
argumento nos tribunais,
o testemunho de alguns
artistas expressando sua
confiança a respeito da
mediunidade,
principalmente a de
Chico Xavier. A atriz
Nair Belo
relembrou detalhes,
alguns deles triviais,
conhecidos só por ela e
totalmente esquecidos,
mencionados pelo
Espírito do filho em uma
dessas cartas, ele que
morreu num acidente de
carro. Falaram
Glória Menezes
e Caio Blat. Um pastor
presbiteriano qualificou
a psicografia de
“cristãmente perfeita”.
O programa não mencionou
outro caso envolvendo o
ex-deputado federal
Heitor Alencar Furtado,
cujo filho foi
assassinado no Paraná e
uma mensagem
psicografada por Chico
provocou sua desistência
na acusação. O réu
acabou sendo condenado
por homicídio simples.
O exercício da
mediunidade não é
exclusividade dos
espíritas,
mas sempre que ocorrer
em seu meio é preciso
vê-la – e praticá-la –
com responsabilidade e
para fins úteis e não
para protagonizar
espetáculos, satisfazer
a vã curiosidade ou
atender a objetivos
escusos.
A proibição de Moisés,
tão invocada por certos
segmentos para
justificar seu banimento
nas relações dos homens
com o mundo espiritual e
até de execração dos
médiuns,
tinha justamente por
objetivo coibir os
abusos
então praticados. Diz-se
que é impossível os
Espíritos se
comunicarem. Ora, não se
proíbe algo que não é
possível de ocorrer.
Vemos os casos aqui
citados como uma exceção
à regra. Não entendemos
devam ser incentivados.
O uso em julgamentos da
justiça terrena, além da
polêmica jurídica em
aceitá-las ou não,
abririam perigosas
brechas para que, a todo
momento, surgissem novos
casos de alegadas
declarações dos
desencarnados.
Cabe à justiça dos
homens
envidar todos os
esforços
para que todos sejam
julgados com
imparcialidade,
esgotados todos os meios
de investigação
cabíveis. Há mais um
agravante. Embora a
rigor todos nós,
aceitemos isto ou não,
sejamos médiuns em maior
ou menor grau, é
evidente que os casos
descritos foram
considerados autênticos
dada a intocável
reputação moral de Chico
Xavier. Quaisquer outros
receberiam críticas mais
acerbas e dificilmente
seriam admitidos como
porta-vozes do além para
questões tão delicadas
como esta.