Igreja e Estado perderam a força moral
Para um grande número de pessoas o comportamento
religioso é puramente protocolar, não toca o coração,
não tem raízes na alma. É um procedimento passivo com
hora marcada para a sua prática, ou seja, o período que
dura a reunião dos adeptos nos seus núcleos, uma ou mais
vezes por semana. E assim passam os anos, décadas até,
sem alterações significativas na base de pensamento
dessa gente toda.
Só saem dessa rotina escravizante aqueles que se
predispõem a ler, refletir e discutir as questões reais
de interesse humano. Somente saem dessa rotina alienante
aqueles que não levam às últimas consequências a
dicotomia do sagrado/profano. Saem, aqueles que resolvem
questionar os dogmas contraditórios inventados para
prender as almas nos calabouços da culpa, do medo, do
mistério e da obediência cega.
No livro Rumo às estrelas *, escrito em 1920, o
filósofo inglês H. Dennis Bradley (1846-1934) se mostra
corajoso e verdadeiro quando denuncia:
“Os fundamentos das lições de Cristo foram postos de
lado. Seus princípios foram deformados a ponto de se
tornarem irreconhecíveis; sua filosofia foi infamemente
adaptada às conveniências da Igreja e do Estado. Sua
religião do amor foi retorcida, desnaturada, prostituída
pela hipocrisia que corrói a inteligência. De tal ordem
se transformou em máquina que já nem serve de alavanca
para a Igreja ou o Estado”.
“Como se atrevem as Igrejas a proclamar que obram em
nome do Cristo?”
“As Igrejas perderam a sua razão de existir. Puseram à
mostra o seu materialismo.”
De 1920 para cá as coisas só pioraram.
A força do materialismo é destruidora porque se alimenta
do egoísmo e da ambição do homem que não é educado para
amar e sim para competir, para se sobrepor ao outro e
eliminá-lo se necessário. Igreja e Estado, que no plano
geral poderiam mudar isso, não têm mais força moral para
fazê-lo, se é que algum dia tiveram. Fazem questão de
manter modelos convenientes aos seus interesses, que não
são os interesses da humanidade.
As estruturas de poder do Estado e das Religiões se
mantém praticamente intactas, e honrosos progressos do
pensamento se devem mais a iniciativas isoladas que
sempre aparecem para lançar luz sobre as mentalidades.
Mas os senhores do mundo, que apontam a direção que a
humanidade “deve” seguir, não se deixam jamais contagiar
por essa luz de renovação, mesmo porque se o fizer,
perderão o controle.
Muitas das seitas que hoje se denominam cristãs (mas não
só elas) se locupletam com as vantagens dos poderes
temporais, e grande parte dos governantes da Terra se
deixam inebriar pelas ilusões do poder e do mando.
Na verdade, essas constatações não são novidade. Resta
saber como o homem resolverá esse entrave da sua
evolução, qual seja, a manutenção indefinida dessas
estruturas viciosas e ultrapassadas que têm adoecido a
humanidade. O que menos querem os religiosos dogmáticos
é penetrar nas causas do sofrimento humano, pois isso
implicaria na revisão dos seus conceitos estruturais. O
que mais pretendem os governantes vis é maquiar os
efeitos causados pela ignorância, pois isso os mantém no
poder.
Resta aos núcleos sociais instruídos e conscientes,
mundo afora, continuarem lutando pela transformação que
só a educação com amor, e o amor pela educação, podem
fomentar. Essa transformação fará surgir homens mais
maduros e espiritualizados, que farão das religiões que
restarem e dos governos que se sustentarem alavancas de
progresso e felicidade.
Não faltam doutrinas morais, faltam juízo e boa vontade.
*Edição LAKE, 1999.
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