WILSON CZERSKI
wilsonczerski@brturbo.com.br
Curitiba, Paraná
(Brasil)
A
educação integral é o
antídoto perfeito contra
a violência
Quarenta mil homicídios
– a grande maioria pelas
oito milhões de armas de
fogo em posse da
população civil –,
trinta e um mil mortos
no trânsito (*), dezenas
de milhares de feridos,
de mutilados, de
incapacitados
permanentes; bilhões de
reais em prejuízos
materiais e gastos com
tratamentos médicos e
indenizações. Esse,
apenas o saldo
"material" do inventário
macabro anual no Brasil.
E o sofrimento moral das
vítimas e suas famílias?
Quanta dor, quanta
impunidade e "injustiça"
não reparada, quantas
pessoas lançadas
tragicamente à viuvez e
orfandade. Quantos
talentos, quantas vidas
preciosas – e toda vida
humana o é – ceifadas
brutalmente!
Dois fatos atuais
veiculados pela mídia
estão relacionados à
luta contra a violência
em nosso país. O dia 22
de setembro, véspera do
início da primavera no
hemisfério sul, marca em
muitos países, já há
alguns anos, o “Dia do
Sem Carro" e pela paz no
trânsito. Desta vez
(**), 30 cidades
brasileiras de médio e
grande porte aderiram.
Grandes áreas centrais
foram interditadas ao
tráfego de veículos
particulares; parecia
feriado ou domingo.
Executivos utilizaram-se
do transporte coletivo,
bicicletas ou seguiram a
pé. Na verdade, a
ocasião serviu também
para promover a
conscientização sobre os
cuidados com a qualidade
do ar e meio ambiente
das grandes metrópoles.
Infelizmente, nas duas
maiores, São Paulo e Rio
de Janeiro, não houve a
participação desejável e
os engarrafamentos foram
os de sempre.
O outro tópico refere-se
ao Estatuto do
Desarmamento que tramita
na Câmara Federal.
Embora algo desfigurado
da proposta original –
bem mais rígida e
abrangente –, devido à
pressão dos lobbyes,
ainda assim, bem melhor
do que se nada fosse
feito pelas
autoridades.
E o Espiritismo
entra aonde nesta
estória? Ora, o
pensamento espírita em
seu arcabouço, aqui
principalmente,
filosófico e religioso
ou ético-moral, é o
elemento transformador
por excelência do ser
humano. Tem
elementos
suficientemente
desenvolvidos, de modo
racional e consistente,
para contribuir na
solução da maioria dos
grandes problemas que o
afligem, oferecendo
valores concretos para a
sua felicidade
verdadeira, livre da
ilusão material, apesar
de inserido no contexto
social momentâneo de sua
evolução como ser
encarnado.
Fazemos um parêntese
aqui para dizer que, se
tal objetivo magno
parece inalcançável, tal
ocorre não por falta de
qualidade na mensagem
espírita e sim pela
deficiência na
instrumentalização de
fazê-la chegar às
massas. Falta de
conhecimento,
indiferença ou falta de
preparo das lideranças,
metodologias
ultrapassadas, linguagem
inapropriada, falta de
recursos humanos e
econômicos são alguns
dos fatores que emperram
a divulgação espírita,
sonegando informações
capazes de, se
devidamente veiculadas,
modificar, de fato, a
sociedade.
Mas, voltando ao nosso
assunto inicial,
aplaudimos iniciativas
como as acima
citadas, como julgamos
válidos os protestos, as
passeatas, as campanhas
que visam atenuar o
impacto da violência
urbana e, agora também,
a rural. Mas não
podemos ser ingênuos de
pensar que só com
estas medidas o
problema já estará
resolvido. De forma
alguma. Mesmo a
restrição do uso de
armas de fogo que, sem
dúvida, muito favorece a
criminalidade em geral e
os homicídios em
particular. Mas a arma
continua sendo somente
um instrumento que pode
ser substituído por
outros, talvez não tão
eficientes como as armas
brancas, e, de qualquer
forma, com o dinheiro
que circula no
narcotráfico e pela
falta de estrutura da
aparelhagem repressora e
preventiva do Estado, as
armas de fogo
continuarão chegando às
mãos dos indivíduos mais
perniciosos ao organismo
social e fazendo suas
vítimas. Devemos
desarmar, antes de
mais nada, nossos
Espíritos e isto só
se obtém pela prática do
amor e da fraternidade
legítima e com todos e
não só com uns poucos. É
o que deduzimos das
palavras do Cristo:
Mas se amardes somente
àqueles que vos amam,
que mérito tereis?
É de se assinalar também
que a imensa maioria das
pessoas que habitam este
país é constituída por
gente séria, honesta e
trabalhadora, mas o
poder da minoria bandida
prevalece.
Na resposta à questão
934 de O Livro dos
Espíritos, os
Orientadores
Espirituais, uma vez
mais, elegeram o
egoísmo como o vilão
máximo do sofrimento da
humanidade para, a
seguir, afirmarem que "À
medida que os homens
se esclarecem sobre as
coisas espirituais,
ligam menos valor às
coisas materiais... É
preciso reformar as
instituições humanas que
o entretêm (ao
egoísmo). Isso
depende da educação".
Anteriormente, na
mesma obra, na questão
685, é o próprio Allan
Kardec que acrescenta
comentário sobre o tema
econômico, dizendo: "Há
um elemento... sem o
qual a ciência econômica
não é mais que uma
teoria: a educação.
Não a educação
intelectual, mas a...
moral e não a educação
moral pelos livros, mas
aquela que consiste na
arte de formar os
caracteres, a que
dá os hábitos:
porque a educação é o
conjunto de hábitos
adquiridos. Quando
se pensa na massa de
indivíduos jogados cada
dia na torrente da
população, sem
princípios, sem freios,
e entregues aos seus
próprios instintos,
deve-se espantar das
consequências
desastrosas que
resultam? (Neste
parágrafo, o negritado é
do autor da obra e o
sublinhado do autor
deste artigo).
Aí está. Que se reflita
sobre a colocação
magistral do Codificador
da Doutrina Espírita.
Educar, mais que
instruir e não só pelos
livros, mas pelo
exemplo prático.
Educação maciça iniciada
nos lares por pais
bem preparados,
conscientes e
responsáveis,
passando pelos
estabelecimentos de
ensino onde poderiam ser
incluídas disciplinas
específicas de trânsito,
de cidadania, meio
ambiente, respeito ao
patrimônio público,
prevenções sanitárias e
antidrogas, incluindo os
malefícios provindos do
tabagismo e do
alcoolismo, importância
da doação de órgãos etc.
E, mais além, com
campanhas envolvendo as
igrejas de todos os
credos – isto vale
também para os espíritas
–, ONGs e instituições
diversas da sociedade
civil, como OAB, a mídia
e outras.
Este modelo,
que possui a desvantagem
de provocar resultados
mais significativos de
médio e longo prazos,
tem o mérito de ser
mais definitivo,
atacando as causas
dos males, violência
inclusa. Já as medidas
repressivas, melhor
aparelhamento policial,
reformulação do sistema
carcerário e mecanismos
de ressocialização dos
ex-detentos,
reestruturação do
Judiciário, desarmamento
e tantos outros também
são úteis e necessários,
atacando, embora, apenas
as consequências que, em
última análise, como
vimos, é o egoísmo
humano.
Este, de fato, só poderá
ser extirpado
inteiramente do corpo
social com o passar
talvez de vários
séculos, mas efeitos
parciais e no terreno
individual podem ser
sentidos de imediato à
aplicação quando
simplesmente
ensinamos nosso filho de
três ou cinco anos a
respeitar o também
filhinho querido da
empregada doméstica,
sempre, mesmo que
eventualmente tenha
outra cor de pele; ou
quando não permitimos
que o filho adolescente
dirija automóvel visto
ainda não estar
habilitado para tal e,
se mais velho e
habilitado, que receba
aconselhamento, seja
conscientizado para a
responsabilidade que lhe
pesa nos ombros com
relação à sua própria
integridade física e a
dos outros. Ou então
quando rejeitamos a
sugestão para
adquirirmos uma arma de
fogo a pretexto de
proporcionarmos mais
segurança a nós e à
família, o que é uma
grande quimera e, antes,
mais um fator de risco.
As leis e a ordem
impostas à sociedade
como resposta à
exigência coletiva são
bem-vindas e
necessárias, mas
extremamente melhor
quando todos souberem,
senão amar e fazer ao
próximo quanto e o que
desejaria que lhe
fizessem, pelo menos
respeitar seus direitos,
especialmente os mais
fundamentais como a
vida.
Quanto à lei de Causa e
Efeito,
carma, justiça divina,
verdade que elas se
materializam através dos
próprios homens
equivocados no passado
longínquo ou recente,
como contingência do
estágio evolutivo que
nos encontramos. Mas não
deixa de ser verdadeiro
também que Deus dispõe
de outros mecanismos
para punir suas
criaturas empedernidas
no mal, feri-las em seu
orgulho e atingir-lhes o
ego. Dispensa o
"empurrãozinho" de nós
outros, como muitos
pensam ser necessário,
justificando assim o
estado de coisas atual e
até a nossa própria
indolência.
(*) Dados de 2002.
(**) Ano de 2003.