O leitor Isaias Fernandes da
Silva, de Joinville-SC, em
carta dirigida a esta
revista, pergunta-nos se o
advogado e o defensor
público espírita podem
defender uma pessoa
criminosa sem ferir seus
princípios doutrinários.
Observa ele que, embora um
advogado possa aceitar ou
não defender alguém que
queira contratá-lo, o mesmo
não é possível ao Defensor
Público, que não pode
escolher clientes nem se
negar a cumprir seu dever. E
indaga ainda: “A título de
cumprir sua obrigação
profissional ele pode
idealizar e engendrar uma
tese de defesa que
signifique mentir, ocultar
fatos, apresentar provas e
testemunhas que sabe ser um
engodo, tudo com o objetivo
de defender seu
representado?”
A carta ora mencionada foi
publicada em nossa edição
230, com a observação de
que, dada a complexidade do
assunto, a pergunta
formulada pelo leitor seria
respondida oportunamente. É
o que procuraremos fazer
agora, depois de ouvir sobre
o assunto alguns amigos que
se caracterizam pelo
conhecimento que possuem
acerca da doutrina espírita
e das nuanças do Direito
aplicado.
Eis algumas premissas
importantes que devemos
destacar com relação ao tema
acima:
1. Em qualquer área em que
atue, o espírita deve pautar
sua conduta pela ética e
pelo respeito à verdade.
Seja médico, engenheiro ou
advogado, ninguém está imune
a essa exigência.
2. Toda dissimulação e toda
mentira acarretarão mais
tarde, para a pessoa, as
consequências de que ninguém
pode fugir.
3. Todas as pessoas, sem
nenhuma exceção, têm direito
à defesa e, portanto, o
Defensor Público nomeado
deverá atender ao seu dever,
com honra e dignidade,
procurando, porém, no
cumprimento de sua obrigação
não ser incoerente nem
valer-se de meios e
subterfúgios moralmente
escusos.
4. O advogado livremente
contratado ou o Defensor
Público, se tiverem
convicção com respeito à
culpa do cliente, poderão
postular em favor dele
outros direitos, jamais a
absolvição por negativa de
autoria. Poderão, por
exemplo, pleitear
diminuições de pena, se
devidas, excludentes da
ilicitude (exemplo: legítima
defesa), se cabíveis, e a
aplicação de pena mais
branda, inclusive as
denominadas penas
alternativas, se preenchidos
os requisitos legais.
5. Em caso de dúvida quanto
à culpa do cliente,
sobretudo quando o réu,
valendo-se da mentira, induz
o advogado em erro,
obviamente não haverá para
este nenhuma espécie de
responsabilidade.
6. Caso o Defensor Público,
por ser espírita, não queira
enfrentar situações desse
tipo, para estar em paz com
a própria consciência, pode
tentar o deslocamento para
outra área de atuação,
passando a atuar, por
exemplo, no ramo da família,
da infância e da juventude.
Diversos advogados
espíritas, exatamente por
causa do tema suscitado pelo
leitor, optam por não atuar
na área criminal.
*
Existem pessoas que, por
princípio, são contra a
segregação dos indivíduos
condenados por um crime,
ainda quando não haja
dúvidas quanto à sua culpa.
Hilário Silva comenta o
assunto no cap. 20 do seu
livro Almas em Desfile, que
Chico Xavier psicografou.
Eis o caso relatado por
Hilário Silva:
“À porta do foro, o juiz
Carmo Neto dizia ao advogado
Luís Soeiro:
– Você poderá, sem dúvida,
funcionar na defesa, mas, na
condição de juiz e de
espírita mais experiente,
não posso compreender a
maneira pela qual você
observa o caso... O réu é
homicida e ladrão, abateu o
próprio tio para roubar...
Não sou a favor da pena de
morte, nem posso aprovar a
prisão perpétua. Deus nos
livre de semelhantes
flagelos! Mas entendo que
esses delinquentes são
enfermos do espírito,
requisitando segregação.
Alguns anos de escola e de
tratamento reajustam os
doentes dessa espécie... Não
podemos libertar loucos
furiosos... A própria Lei
Divina nos concede na
reencarnação os meios
precisos de reajuste.
Contudo, o advogado,
espírita recentemente
chegado à Doutrina,
observava:
– Doutor, mesmo assim
defendê-lo-ei gratuitamente,
com todas as minhas forças,
acreditando servir à
caridade... Não concordo
absolutamente com prisão
para ninguém...
– Aprecio a sua atitude –
volveu o magistrado –; como
espírita, igualmente não
aprovo a cadeia, o castigo,
a violência, mas os
delinquentes de grandes
crimes são doentes perigosos
que precisamos apartar da
sociedade para a adequada
assistência.
Chegada a hora do
julgamento, o Dr. Luís
Soeiro falou com tanta
emotividade e eloquência,
com tanto carinho e amor
fraterno que o réu foi
absolvido por unanimidade.
O feito foi comemorado
festivamente.
Decorridas algumas semanas,
o advogado e a esposa
desembarcaram, alta noite,
em cidade próxima, de visita
a familiares. Caminhavam na
rua deserta, quando um
desconhecido avança sobre a
senhora indefesa. O marido
reage, grita por socorro,
ajuntam-se populares e o
homem é preso.
Foi então que o Dr. Luís
Soeiro verificou, espantado,
que o assaltante era o
cliente para o qual havia
conseguido a liberdade.”
Um dos colaboradores de
nossa revista, Dr.
Alessandro Viana Vieira de
Paula, juiz de Direito em
Itapetininga-SP, a propósito
do assunto em pauta,
relatou-nos o seguinte:
“Certa feita o confrade Raul
Teixeira nos contou uma
história reproduzida pelo
Irmão X numa das obras
psicografadas por Chico
Xavier. Havia um advogado
muito hábil em dissimular,
conseguir absolvições e
arrumar nulidades nos
processos, de forma que ele
ficou conhecido como ‘o
grande cabeção’. Muitos
contratavam seus serviços
porque sabiam da sua
habilidade em buscar a
absolvição. Ele desencarnou
e, porque se comprometeu na
área da inteligência,
renasceu com macrocefalia.
Quando era criança já exibia
uma cabeça enorme e o
Benfeitor dizia: Aí está o
grande cabeção, agora
literalmente.”
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