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Clássicos do Espiritismo
Ano 8 - N° 369 - 29 de Junho de 2014
ANGÉLICA REIS
a_reis_imortal@yahoo.com.br
Londrina, Paraná (Brasil)
 


 

No Invisível

Léon Denis

(Parte 44)

Continuamos o estudo metódico e sequencial do clássico "No Invisível", de Léon Denis, cujo título no original francês é Dans l'Invisible.

Questões preliminares  

A. Em que sentido o intercâmbio com os Espíritos pode ser-lhes benéfico?

A experiência todos os dias o demonstra: graças aos conselhos dos humanos, muitas almas obscurecidas e atrasadas têm podido reconhecer-se e orientar-se em sua nova existência. Na maior parte, os materialistas passam pelo fenômeno da morte sem o perceber. Acreditam ainda participar da vida terrestre, muito tempo depois de haverem falecido. Os Espíritos elevados não têm ação sobre eles, em virtude das diferenças de densidade fluídica, ao passo que as evocações, as advertências, as explicações que eles recebem nos grupos espíritas os arrancam de seu torpor e de seu estado de inconsciência. Para nós, como para os desencarnados, a comunhão das duas humanidades é salutar, quando se efetua em condições sérias. (No Invisível, 3ª Parte. XXIII - Hipóteses e objeções.)

B. Se, conforme o Espiritismo, não existem demônios, quem são esses seres malfazejos que tanto mal causam aos encarnados?  

Aqueles a quem se deu o nome de demônios são, em verdade, Espíritos inferiores, ainda propensos ao mal, submetidos, porém, como todas as almas, à lei do progresso, porque não há diversas categorias de almas, destinadas umas à felicidade e outras à desgraça eterna. Todas elas se elevam pelo trabalho, pelo estudo e pelo sofrimento. (Obra citada, 3ª Parte. XXIII - Hipóteses e objeções.)

C. No tocante aos abusos da mediunidade, que fatos Léon Denis assinala em primeiro lugar?  

Ele menciona, em primeiro lugar, as fraudes, as simulações, que podem ser conscientes e volitivas, ou inconscientes. Neste último caso são elas provocadas quer pela ação de Espíritos malfazejos, quer por sugestões sobre os médiuns exercidas pelos experimentadores e assistentes. Já as fraudes conscientes provêm ora de falsos médiuns, ora de médiuns verdadeiros, mas pérfidos, que têm feito de sua faculdade uma fonte de proventos materiais. Desconhecendo a nobreza e a importância de sua missão, por natureza preciosa, eles a transformam num meio de exploração e não trepidam, quando falha o fenômeno, em o simular com artifícios. (Obra citada, 3ª Parte. XXIV - Abusos da mediunidade.) 

Texto para leitura 

1130. Quanto à segunda objeção, não tem maior consistência. Como poderiam ser condenáveis essas comunhões do Céu com a Terra, da qual sai a alma humana esclarecida, confortada, enlevada por todas as exortações, por todas as inspirações que lhe vêm do Alto? As práticas espíritas têm consolado e reanimado muitas criaturas combalidas sob a prova da separação; têm restituído a paz aos aflitos, provando-lhes que aqueles que julgavam perdidos estão apenas ocultos por algum tempo a suas vistas. E que influência moral exerce em toda a nossa vida o pensamento de que seres caros, seres invisíveis nos acompanham e observam, examinam e apreciam os nossos atos, e que os nossos bem-amados estão muitas vezes perto de nós, associando-se aos nossos esforços para o bem, regozijando-se com as nossas alegrias, com os nossos progressos, e entristecendo-se com os nossos desfalecimentos, como nos amparando nas situações difíceis! Quem haverá que, tendo perdido um ente caro, possa permanecer indiferente a esse pensamento?

1131. Longe de estorvar a evolução das almas desencarnadas, sabemos, ao contrário, que os nossos chamados a favorecem em muitos casos. Não se trata de evocações imperiosas, como o pretenderiam insinuar. Os Espíritos são livres e vêm a nós se isso lhes agrada. Ao demais, que é em si mesma a evocação? É a frágil palavra humana ensaiando-se em articular a linguagem sublime do pensamento; é o balbuciar da alma que entra na comunhão divina e universal!

1132. A experiência todos os dias o demonstra: graças aos conselhos dos humanos, muitas almas obscurecidas e atrasadas têm podido reconhecer-se e orientar-se em sua nova existência. Na maior parte, os materialistas passam pelo fenômeno da morte sem o perceber. Acreditam ainda participar da vida terrestre, muito tempo depois de haverem falecido. Os Espíritos elevados não têm ação sobre eles, em virtude das diferenças de densidade fluídica, ao passo que as evocações, as advertências, as explicações que eles recebem nos grupos espíritas os arrancam de seu torpor, de seu estado de inconsciência, e lhes facilitam o surto, em vez de o estorvar. Para nós, como para os desencarnados, a comunhão das duas humanidades é salutar, quando se efetua em condições sérias. É um ensino mútuo ministrado pelos Espíritos adiantados de ambos os planos, visando esclarecer, consolar e moralizar as almas sofredoras ou atrasadas dos dois mundos.

1133. As teorias dos ocultistas e teósofos, tão justas no que se refere à lei do Carma, ou das reencarnações, claudicam por completo no ponto de que nos ocupamos. Apartando o investigador do método experimental, para o encerrar no domínio da metafísica pura, elas suprimiram a única base positiva de toda a verdadeira filosofia. Graças às provas experimentais é que a imortalidade, mero conceito até agora, vaga esperança do espírito humano, se torna uma realidade palpitante. E com ela, muitas almas cépticas e desiludidas se sentem reviver em face dos destinos que lhes são patenteados. Longe de as depreciar, saibamos, conseguintemente, fazer justiça a essas práticas espíritas que têm enxugado tantas lágrimas, acalmado tantas dores e projetado tão abundantes claridades na noite das inteligências.

1134. Voltemos à teoria do demônio e consideremos uma questão: se o Espírito maligno, como pretendem os teólogos, têm a facilidade de reproduzir todas as formas, todas as figuras, revelar as coisas ocultas, proferir as mais sublimes alocuções; se nos ensina o bem, a caridade, o amor, pode-se igualmente atribuir-lhe as aparições mencionadas nos livros santos, acreditar que foi ele quem falou a Moisés, aos outros profetas e ao próprio Cristo, e que toda ação espiritual oculta é obra sua.

1135. O diabo, tudo sabendo e podendo, até mesmo fazer sábio e virtuoso o Espírito, pode muito bem ter assumido o papel de guia religioso e, sob o pálio da Igreja, nos conduzir à perdição. A História, com efeito, nos demonstra com irrefragável lógica que nem sempre a Igreja foi inspirada por Deus. Em muitas circunstâncias, os seus atos têm estado em absoluta contradição com os atributos de que nos apraz revestir a divindade. A Igreja é uma árvore colossal, cujos frutos nem sempre foram os melhores, e o diabo – pois que é tão hábil – pode muito bem se ter abrigado à sua sombra.

1136. Se devemos admitir, com os teólogos, que em todos os tempos e lugares tenha Deus permitido as mais odiosas fraudes, o mundo se nos apresentará como imensa impostura e nenhuma segurança teremos de não ser enganados: tanto pela Igreja como pelo Espiritismo. A Igreja – ela própria o reconhece – apenas possui, relativamente ao que denomina “sobrenatural diabólico ou divino”, um critério de certeza puramente moral. E daí, com tão restritas bases de apreciação, dado o talento de imitação que atribui ao inimigo do gênero humano, que crédito a ela própria podemos conceder em todas as matérias? É assim que o argumento do demônio, como arma de dois gumes, se pode voltar contra aqueles que o forjaram.

1137. Cabe, entretanto, perguntar se de fato haveria tamanha habilidade da parte do diabo em proceder como os nossos contraditores o pretendem. Nas sessões espíritas, vê-lo-íamos convencer da sobrevivência da alma e da responsabilidade dos atos a indivíduos materialistas; libertar da dúvida os cépticos, e da negação e de todas as suas consequências, dizer às vezes duras verdades a pessoas desregradas e obrigá-las a cair em si e orientar-se no sentido do bem. Onde estaria, pois, em tudo isso a vantagem para Satanás? Não deveria, ao contrário, o papel do Espírito das trevas consistir em acoroçoar em suas tendências os materialistas, os ateus, os cépticos e os indivíduos sensuais?

1138. É verdadeiramente pueril atribuir ao demônio o ensino moral que nos prodigalizam os Espíritos elevados. Acreditar que Satanás se esforce por desviar os homens do mal, ao passo que, deixando-os resvalar pelo declive das paixões, tornar-se-iam fatalmente presa sua; crer que pode ensiná-los a amar, a orar, a servir a Deus, a ponto de lhes ditar preces, é atribuir-lhe um procedimento ridículo extremamente inepto.

1139. Se o diabo é hábil, podem imputar-lhe as respostas ingênuas, grosseiras, ininteligentes, obtidas nos círculos onde se experimenta sem critério? E as manifestações obscenas! Não são antes próprias a nos afastar do que a nos atrair para ele? Ao passo que, admitindo a intervenção de Espíritos de todas as ordens, desde a mais baixa à mais elevada, tudo se explica racionalmente. Os Espíritos malfazejos não são de natureza diabólica, mas de natureza simplesmente humana.

1140. Não há na Terra, encarnadas entre nós, almas perversas, que se poderiam considerar demônios? Voltando ao Espaço, essas almas continuam a proceder do mesmo modo, até que venham a ser regeneradas pelas provações, subjugadas pelos sofrimentos. Aos investigadores prudentes compete pôr-se em guarda contra esses entes funestos e reagir contra sua influência.

1141. Na maior parte dos círculos de experimentação, em lugar de proceder com cautela e respeito, desprezam-se os conselhos dos que nos precederam no caminho das investigações. Com intempestivas exigências e modos inconvenientes, repelem-se as influências harmônicas e atraem-se individualidades perversas e Espíritos atrasados. Daí tantas decepções, incoerências, obsessões, que têm feito acreditar na existência dos demônios e lançado sobre certo “espiritismo” de baixa classe o ridículo e o descrédito.

1142. A teoria do demônio, em resumo, nem é positiva nem científica. É um argumento cômodo, que se presta às explorações, permite rejeitar todas as provas, todos os casos de identidade, e fazer tábua rasa dos mais autorizados testemunhos; pouco concludente, porém, e absolutamente em contradição com a natureza dos fatos.

1143. A crença no demônio e no inferno tem sido combatida com argumentos de tal modo peremptórios que causa admiração ver inteligências esclarecidas ainda hoje a adotarem. Deus, sendo justo e bom, como o declara o ensino católico, não pode ter criado um ser dotado de toda a ciência do mal, de toda sorte de sedução, e lhe haver concedido poder absoluto sobre o homem inerme e fraco. Ou Satanás é eterno, ou não o é. Se o é, Deus não é único; há dois deuses – o do bem e o do mal. Ou então Satanás é uma criatura de Deus, e logo a Deus cabe a responsabilidade de todo o mal por ele praticado; porque, ao criá-lo, conheceu, viu todas as consequências de sua obra. E o inferno povoado da imensa maioria das almas, votadas por sua fraqueza original ao pecado e à condenação, é a obra de Deus, produto de sua vontade e por ele prevista!

1144. Tais são as consequências da teoria de Satanás e do inferno. É de admirar que tenha produzido tantos materialistas e ateus? E é em nome do Cristo, de seus ensinos de amor, de caridade e de perdão que se preconizam tais doutrinas!

1145. Aqueles a quem se chamam demônios são, em verdade, simplesmente Espíritos inferiores, ainda propensos ao mal, submetidos, porém, como todas as almas, à lei do progresso. Não há diversas categorias de almas, destinadas umas à felicidade e outras à desgraça eterna. Todas se elevam pelo trabalho, pelo estudo e pelo sofrimento. A unidade perfeita e a harmonia reinam no Universo.

1146. Acenar com o espectro de Satanás e toda a fantasmagoria do inferno, numa época em que a Humanidade já não crê nos mitos com que a embalaram na infância, é perpetrar um anacronismo, é expor-se a provocar o riso. Satanás não assusta mais ninguém. E os que mais dele falam são, talvez, os que nele menos creem. Pode-se explorar o esvaecimento de uma quimera rendosa, de que por muito tempo se abusou, e soltar aos quatro ventos os ecos de sua queixa. Diante, porém, de tais recriminações, próprias de uma outra idade, o pensador desinteressado sorri e passa adiante.

1147. Já não acreditamos num Deus colérico e vingativo, mas em um Deus de justiça e de infinita misericórdia. O Jeová sanguinário e terrível fez sua época. O inferno implacável fechou-se para sempre. Do Céu à Terra desce agora, com a nova revelação, o lenitivo para todas as dores, o perdão para todas as fraquezas, o resgate para todos os crimes, mediante o arrependimento e a expiação.

1148. XXIV - Abusos da mediunidade – Na primeira ordem dos abusos que devemos assinalar, cumpre colocar as fraudes, as simulações. As fraudes ou são conscientes e volitivas, ou inconscientes. Neste último caso são provocadas quer pela ação de Espíritos malfazejos, quer por sugestões sobre os médiuns exercidas pelos experimentadores e assistentes.

1149. As fraudes conscientes provêm ora de falsos médiuns, ora de médiuns verdadeiros, mas pérfidos, que têm feito de sua faculdade uma fonte de proventos materiais. Desconhecendo a nobreza e a importância de sua missão, por natureza preciosa, eles a transformam num meio de exploração e não trepidam, quando falha o fenômeno, em o simular com artifícios.

1150. Os falsos médiuns se encontram um pouco por toda parte. Uns não passam de péssimos farsistas que se divertem à custa do vulgacho e a si mesmos se traem cedo ou tarde. Outros há, industriosos, hábeis, para os quais o Espiritismo é apenas uma mercancia; esforçam-se por imitar as manifestações, tendo em mira o lucro a auferir. Muitos têm sido desmascarados em plena sessão; alguns já foram colhidos nas malhas de ruidosos processos.

1151. Nessa ordem de fatos, têm sido presenciadas as mais audaciosas falcatruas.  Certos indivíduos, abusando da boa-fé dos que os consultam, não têm hesitado em profanar os mais sagrados sentimentos e tornar suspeitas uma ciência e doutrinas que podem ser um meio de regeneração. Na maioria das vezes, são destituídos do sentimento de sua responsabilidade; mas na vida de além-túmulo bem desagradáveis surpresas lhes estão reservadas.

1152. É incalculável o prejuízo por esses espertalhões causado à verdade. Com seus artifícios têm afastado muitos pensadores do estudo sério do Espiritismo. Por isso é dever de todo homem de bem desmascará-los, expô-los à merecida execração. O desprezo neste mundo, o remorso e a vergonha no outro – eis o que os espera. Porque, nós o sabemos, tudo se paga: o mal recai sempre sobre aquele que o pratica.

1153. Não há coisa mais vil, mais desprezível, que bater moeda sobre as dores alheias, simular, a troco de dinheiro, os amigos, os entes caros que choramos, fazer da própria morte uma especulação desbriada, um objeto de falsificação. O Espiritismo não pode ser responsabilizado por tais manejos. O abuso ou imitação de uma coisa nada pode fazer prejulgar contra a própria coisa.

1154. Tem-se dado o fato de certos médiuns, dotados de notáveis faculdades, não terem vacilado em misturar, nas sessões que realizam, as simulações com os fatos reais, visando aumentar os proventos ou a fama que desfrutam. Perguntarão talvez por que anuem os desencarnados a prestar o seu concurso a indivíduos de tal sorte indignos. A resposta é fácil. Esses Espíritos, em seu vivo desejo de se manifestarem aos que na Terra amaram, encontrando em tais médiuns os elementos necessários para se materializarem, tornando-se visíveis, e, assim, demonstrarem a própria sobrevivência, não hesitam em utilizar os meios que se lhes oferecem, não obstante a indignidade dos intermediários. Foi o que sucedeu em 1906, 1907 e 1908, no curso de sessões efetuadas em Paris por um médium estrangeiro, de que já falei no prefácio desta obra. (Continua no próximo número.)
 

Carma – [Do sânscr. karman, 'ação'.] S. m. Filos.  Nas filosofias da Índia, o conjunto das ações dos homens e suas consequências. Liga-se o carma às diversas teorias de transmigração, e por meio dele se definem as noções de destino, do desejo como força geradora do destino, e do encadeamento necessário, por força desses dois fatores, entre os diversos momentos da vida dos homens.

Mercancia – (í). [Do it. mercanzia.] S. f.  Mercadoria (1 e 2). Ato de mercanciar ou mercadejar; tráfico, comércio, mercadejo.

Vulgacho – S. m. V. ralé (1). A camada mais baixa da sociedade.

 


 


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O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita