A. Como
Platão
define
Deus?
Deus é o
geômetra
que
opera
eternamente.
Não é,
pois,
como
dizia
Lutero,
“um
quadro
vazio,
sem
outra
inscrição
além da
que lhe
apomos”.
Deus é,
ao
contrário,
a força
inteligente,
universal
e
invisível,
que
constrói
sem
cessar a
obra da
Natureza. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
B.
Podemos
dizer
que a
Natureza
é um ser
vivo e
animado?
Sim.
Segundo
Flammarion,
a
Natureza
é um ser
vivo e
animado,
e mais
ainda –
um ser
amigo.
Onipresente,
fala-nos
pelas
suas
cores,
pelos
sons e
pelos
movimentos;
tem
sorrisos
para as
nossas
alegrias,
gemidos
para as
nossas
tristezas,
simpatia
para
todas as
nossas
aspirações. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
C. As
leis da
Natureza
nos
indicam
que
existe,
por trás
delas,
uma
inteligência
ordenadora?
Evidentemente.
As leis
da
Natureza
nos têm
provado
que
existe
uma
inteligência
ordenadora,
e essas
leis –
diz John
Herschel
– são
não
somente
constantes,
mas
concordantes
e
inteligíveis. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
Texto
para
leitura
1039. Deus –
O prisma
através
do qual
nos
permitimos
concluir
a nossa
demonstração
geral é
antes
síntese
que
peroração;
e se é
verdade
que a
Ciência
e a
Poesia
estão
intimamente
associadas
na
contemplação
da
Natureza,
não
podemos,
judiciosamente,
impedir
o
sentimento
poético
de se
manifestar
nestas
últimas
impressões
que o
panorama
do mundo
nos
sugere.(Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1040.
Apenas,
necessário
fora nos
consagrássemos
agora a
um
estudo
especial
da causa
divina,
visto
que por
essa
causa
temos
combatido
de
início,
neste
longo
arrazoado,
e todas
as
conclusões
atingiram
esse
alvo
supremo.
Contudo,
vale
enfechá-las
numa
conclusão
geral.
Assim
como o
naturalista,
o
botânico,
o
geômetra,
o
lavrador,
o
operário
ou o
poeta,
depois
de
examinar
as
particularidades
de uma
paisagem
e galgar
a colina
de cujo
cimo se
abrangem
os
pontos
estudados,
volta-se
por
contemplar
de
conjunto
a
distribuição,
o plano
e a
beleza
do
panorama,
assim
também,
após o
estudo
particularizado
das leis
da
matéria
e da
vida,
apraz-nos
a ele
voltar e
calmamente
admirá-lo. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1041.
Aos
olhos da
alma
apraz
embevecer-se
na
radiação
celeste,
que
inunda
toda a
Natureza.
Aqui, já
não é a
discussão,
mas a
contemplação
recolhida
da luz e
da vida
resplandecentes
na
atmosfera,
que
brilham
no
cromatismo
das
flores e
refulgem
nos seus
matizes;
que
circulam
na
folhagem
dos
bosques
e
envolvem
num
beijo
universal
os
inumeráveis
seres
palpitantes
no seio
da
Natureza.
Depois
da
potência,
da
sabedoria,
da
inteligência,
é a
bondade
inefável
o que se
faz
sentir;
é a
universal
ternura
de um
ser
misterioso
sempre,
fazendo
sucederem-se
na
superfície
do globo
as
formas
inumeráveis
de uma
vida que
se
perpetua
por amor
e que
jamais
se
extingue. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1042. A
correlação
das
forças
físicas
nos
mostrou
a
unidade
de Deus,
sob
todas as
formas
transitórias
do
movimento.
Pela
síntese,
o
espírito
se eleva
à noção
de uma
lei
única –
lei e
força
universais,
que
valem
por
expressão
ativa do
pensamento
divino.
Luz,
calor,
eletricidade,
magnetismo,
atração,
afinidade,
vida
vegetal,
instinto,
inteligência,
tudo
deriva
de Deus.
O
sentimento
do belo,
a
estesia
das
ciências,
a
harmonia
matemática,
a
geometria,
iluminam
essas
forças
múltiplas
e lhes
dão o
perfume
do
ideal.
Seja
qual for
o prisma
pelo
qual o
pensador
observe
a
Natureza,
encontra
uma
trilha
conducente
a Deus –
força
viva,
cujas
palpitações,
através
de todas
as
formas,
ele as
sentirá
no
estremecer
da
sensitiva,
como no
canto
matinal
dos
passarinhos. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1043.
Tudo é
número,
correspondência,
harmonia,
relação
de uma
causa
inteligente,
agindo
universal
e
eternamente.
Deus não
é, pois,
como
dizia
Lutero,
“um
quadro
vazio,
sem
outra
inscrição
além da
que lhe
apomos”.
Deus é,
ao
contrário,
a força
inteligente,
universal
e
invisível,
que
constrói
sem
cessar a
obra da
Natureza.
É
sentindo-lhe
a
presença
eterna
que
compreendemos
as
palavras
de
Leibnitz:
“há
metafísica,
geometria
e moral
por toda
a
parte”,
bem como
o velho
aforismo
de
Platão,
que
poderemos
assim
traduzir:
Deus é o
geômetra
que
opera
eternamente.(Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1044. É
fora dos
tumultos
da
sociedade
mundana,
no
silêncio
das
profundas
meditações,
que a
alma
pode
rever-se,
em face
da
glória
do
invisível,
manifestada
pelo
visível.
É nessa
visualização
da
presença
de Deus
na Terra
que a
alma se
eleva à
noção do
verdadeiro[i]. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1045. O
ruído
longínquo
do
oceano,
a
paisagem
solitária,
as águas
cujos
murmúrios
valem
sorrisos,
o sono
das
florestas
entrecortado
de
anseios
suspirosos,
a
altivez
impassível
das
montanhas,
tudo
abrangendo
de alto,
são
manifestações
sensíveis
da força
que vela
no âmago
de todas
as
coisas.
Abandonei-me,
algumas
vezes, a
contemplar-vos,
ó
esplendores
vívidos
da
Natureza,
e sempre
vos
senti
envoltos
e
banhados
de
inefável
poesia!
Quando
meu
espírito
se
deixava
seduzir
pela
magia da
vossa
beleza,
ouvia
acordes
desconhecidos
escapando-se
do vosso
concerto. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1046.
Sombras
noturnas
que
flutuais
pela
encosta
das
montanhas,
perfumes
que
baixais
das
florestas,
flores
pendidas
que
cerrais
os
lábios,
surdos
rumores
oceânicos
que
nunca
vos
calais,
calmarias
profundas
de
noites
estreladas,
tendes-me
falado
de Deus,
certo,
com
eloquência
mais
íntima e
mais
empolgante
que
todos os
livros
humanos! (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1047. Em
vós
encontrei
ternuras
maternais,
blandícias
de
inocência,
e sempre
que me
deixava
adormecer
no vosso
regaço
despertava
alegre e
venturoso.
Coloridos
de
esplêndidos
crepúsculos,
deslumbramentos
de
clarores
moribundos,
visões
de
sítios
ermos,
que
deliciosos
momentos
de
ebriedade
não
concedeis
aos que
vos
amam! O
lírio
desabrocha
e bebe,
em
êxtase,
a luz
que
derrama
dos
céus!
Nessas
horas
contemplativas,
a alma
transforma-se
em flor,
aspirando,
ávida,
as
irradiações
celestes. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1048. A
atmosfera
já não
é, tão
somente,
uma
mistura
de
gases;
as
plantas
deixam
de ser
simples
agregados
atômicos
de
carbono
ou
hidrogênio;
os
perfumes
não se
reduzem
a
moléculas
impalpáveis
e só
derramados
à noite,
para
resguardar
as
flores
da
friagem;
a brisa
embalsamada
significa
algo
mais que
uma
simples
corrente
de ar;
as
nuvens
não
representam
apenas
vesículas
de
aquoso
vapor; a
Natureza
não se
oferece
exclusivamente
qual
laboratório
de
química,
ou
gabinete
de
física... (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1049.
Antes,
pelo
contrário,
pressentimos
em tudo
uma lei
de
harmonia
soberana,
que
governa
a marcha
simultânea
de todas
as
coisas,
que
cerca os
mais
íntimos
seres de
uma
vigilância
instintiva,
que
guarda
ciosamente
o
tesouro
da vida
em
plenitude
de
pujança
e que,
por seu
perpétuo
rejuvenescimento,
desdobra
em
potência
imutável
a
fecundidade
criada.
Em toda
esta
Natureza
há uma
espécie
de
beleza
universal,
que a
nossa
alma
respira
e
identifica,
como se
essa
beleza
ideal
pertencesse
unicamente
ao
domicílio
da
inteligência. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1050.
Vésper
que
antecedes
a noite!
carro do
Setentrião!
Magnificências
estelares!
Misteriosas
perspectivas
de
abismo
insondável!
Que
olhar,
apercebido
de
vossas
munificências,
poderia
fitar-vos
indiferente?
Quantos
olhares
sonhadores
se têm
perdido
nos
vossos
desertos,
ó
solidões
do
espaço!
Quantos
ansiosos
pensamentos
têm
viajado
de ilha
em ilha,
no vosso
luminoso
arquipélago!
E nas
horas da
saudade
e da
melancolia,
quantas
pupilas
molhadas
têm
baixado
sobre os
olhos
fitos
numa
estrela
predileta!(Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1051. É
que a
Natureza
tem nos
lábios
palavras
doces,
no olhar
tesouros
de amor
e no
coração
sentimentos
afetivos
de uma
preciosidade
esquisita,
e isso
porque
ela, a
Natureza,
não
consiste
somente
numa
organização
corporal,
mas
também
tem alma
e vida.
Quem
quer que
só a
tenha
entrevisto
no seu
aspecto
material
apenas
lhe
conhece
a
metade.
A beleza
íntima
das
coisas é
tão
verdadeira
e
positiva
como a
sua
composição
química.
A
harmonia
do mundo
não é
menos
digna de
apreço
do que o
seu
movimento
mecânico. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1052. A
direção
inteligente
do
Universo
deve ser
constatada
ao mesmo
título
das
fórmulas
matemáticas.
Obstinar-se
em só
considerar
a
criatura
com os
olhos do
corpo e
jamais
com os
do
espírito
é parar
voluntariamente
à
superfície.
Bem
sabemos
que os
adversários
vão
objetar-nos
que o
espírito
não tem
olhos,
que é um
cego de
nascença
e que
toda
afirmativa,
não
originária
dos
órgãos
visuais,
perde
todo o
valor.
Mas,
isto
também
não
passa de
um
conceito
arbitrário
e, ao
demais,
infundado.
Temos
visto
que é
possível,
de boa
fé, pôr
em
dúvida
as
verdades
de ordem
intelectual
e que é
em nosso
próprio
senso
que se
forma a
convicção
de toda
e
qualquer
verdade. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1053.
Transporemos,
portanto,
sem
receio,
essas
mofinas
objeções.
Para nós
a
Natureza
é um ser
vivo e
animado,
e mais
ainda –
um ser
amigo.
Onipresente,
fala-nos
pelas
suas
cores,
pelos
sons e
pelos
movimentos;
tem
sorrisos
para as
nossas
alegrias,
gemidos
para as
nossas
tristezas,
simpatia
para
todas as
nossas
aspirações.
Filhos
da
Terra,
nosso
organismo
está em
consonâncias
vibratórias
com
todos os
movimentos
que
constituem
a vida
da
Natureza:
ele os
compreende
e deles
compartilhamos,
de modo
a nos
deixarem
n'alma
uma
repercussão
profunda,
a menos
que o
artifício
nos
tenha
atrofiado.
Congênita
do
princípio
da
criação,
nossa
alma
reencontra
o
infinito
na
Natureza.(Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.)
1054.
Para a
ciência
espiritualista,
não mais
se
defrontam
um
mecanismo
automático
e um
Deus
retraído
na sua
imobilidade
absoluta.
Deus é
potência
e ato
naturais;
vive na
Natureza,
como
nele
vive
ela. O
Espírito
se faz
pressentir
através
das
formas
materiais,
mutáveis.
Sim, a
Natureza
tem
harmonias
para a
alma,
tem
quadros
para o
pensamento,
tem
tesouros
para as
ambições
do
espírito
e
ternuras
para as
aspirações
do
coração.
Sim, ela
os tem,
porque
não nos
é
estranha,
não está
de nós
segregada
e somos
um com
ela. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1055.
Ora, a
força
viva da
Natureza,
essa
vida
mental
que
reside
nela,
essa
organização
peculiar
ao
destino
dos
seres,
essa
sabedoria
e
onipotência
no
entretenimento
da
criação,
essa
comunicação
íntima
de um
Espírito
universal
entre
todos os
seres,
que
coisa
outra
poderá
significar
senão a
revelação
da
existência
de Deus,
a
manifestação
de um
pensamento
criador,
eterno,
imenso? (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1056.
Que
significam
a
faculdade
eletiva
das
plantas,
o
instinto
inexplicável
dos
animais,
a
genialidade
do
homem?
Que será
o
governo
da vida
terrestre,
sua
direção
em torno
do seu
foco de
luz e de
calor,
as
revoluções
solares,
a
movimentação
de
mundos
incontáveis
a
gravitarem
conjugados
no
infinito?
Que
significará
tudo
isso,
senão a
demonstração
viva,
imperiosa,
de uma
vontade
que
subordina
o mundo
inteiro
à sua
potência,
como
envolve
as
nossas
obscuridades
na sua
luz? Que
será o
aspecto
espiritual
da
Natureza,
senão
pálida
radiação
da
beleza
eterna?
–
esplendor
desconhecido,
que os
nossos
olhos,
desviados
por
falsas
claridades
da
Terra,
mal
podem
entrever,
nas
horas
santas e
benditas
em que o
divino
Ser nos
permite
sentir
sua
presença. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte. Deus.)
1057. As
leis da
Natureza
nos têm
provado
que
existe
uma
inteligência
ordenadora.
Essas
leis –
diz John
Herschel[ii] –
são, não
somente
constantes,
mas
concordantes
e
inteligíveis.
E são
fáceis
de
apreender
com o
auxílio
de
algumas
pesquisas,
mais
próprias
a
estimular
que a
extinguir
a
curiosidade. (Deus
na
Natureza
– Quinta
Parte.Deus.) (Continua
no
próximo
número.)
[i] Bellarmin – Ascencio mentis in Deum per scalas rerum creatarum.
[ii] On the Study of the Natural Fhilosophy.