Coragem para enfrentar a si mesmo
Essa reflexão, dentro do contexto da reforma íntima,
buscará abordar alguns aspectos em que encontramos
dificuldades, até mesmo falta de coragem, para enfrentar
a luta íntima contra as nossas imperfeições.
Temos coragem para muitas coisas, mas, quando se trata
de combater no nosso interior, mais fácil será
empreender uma luta externa, onde encontraremos as
desculpas para justificar os nossos equívocos, erros,
falhas e vícios, postergando a introspectiva que devemos
realizar para mudar o comportamento e corrigir o rumo na
vida.
Pela metodologia científica, se faço um experimento de
igual maneira, em condições e circunstâncias semelhantes
e controladas, seguindo as etapas definidas,
repetidamente, o resultado da observação será o mesmo,
buscando-se a descoberta da relação de causa e efeito do
fenômeno estudado.
Analogamente, podemos transportar essa visão para a
nossa vida na busca da maioria das causas dos nossos
problemas, cujos efeitos possuem os seus motivos. E para
mudar o que nos vem perturbando até agora, será preciso
buscar um novo caminho para superar as montanhas de
dificuldades. Se não mudar, não há como esperar
resultado diferente.
A reforma íntima envolve a luta contra as próprias
imperfeições na procura da paz interior, por meio do
autodescobrimento e do autoconhecimento, tornando-nos
mais conscientes de nós mesmos e dos nossos recursos
latentes, libertando-nos dos sentimentos inferiores
contrários às leis de Deus, em razão da própria
evolução, mediante esforço, trabalho edificante, prática
do amor e da caridade.
O Espírito Joanna de Ângelis, no livro “Vida: desafios e
soluções”, na psicografia Divaldo Pereira Franco,
esclarece:
“A sua autoidentificação, o autodescobrimento, permite o
conhecimento das necessidades de progresso, ao tempo que
desarticula as dificuldades que foram trabalhadas pelas
experiências negativas das existências transatas, cujos
resíduos continuam produzindo distonias.
Somente quando se passa a viver a compreensão da
realidade interior, descobrindo-se e conservando-se
desperto para a ação do pensamento lógico e consciente,
é que se liberam os efeitos danosos do passado e se
estabelecem novas normas de conduta para o futuro.
Adquire-se então liberdade para a ação criativa, sem as
amarras da culpa, que sempre se estabelece depois de
qualquer atitude irregular, de toda ação prejudicial.
(...)
Se, todavia, não desenvolveu a escala de
autodescobrimento, de maturidade, mergulha nos complexos
dramas do desequilíbrio, perdendo-se no emaranhado das
paixões e dos tormentos que o alienam”.
No mesmo livro, Joanna de
Ângelis ensina mais: “O
autoconhecimento revela ao ser as suas possibilidades e
limitações, abrindo-lhe espaços para a renovação e
conquista de novos horizontes de saúde e plenificação,
sem consciência de culpa, sem estigmas”.
As imperfeições morais conduzem o ser humano ao
cometimento de faltas que podem resultar em
desequilíbrios causadores de grandes perturbações
físicas e espirituais.
Normalmente, procuramos melhorar a aparência física,
cuidar da beleza do corpo, fazer exercícios físicos para
o fortalecimento da musculatura, mas não nos preocupamos
com a nossa melhoria moral e espiritual para enfrentar
os chamamentos que as provações proporcionam. Cuidamos
do corpo físico, por que não cuidamos da alma?
Dominados pelo materialismo, damos asas ao egoísmo, ao
orgulho, à vaidade, dentre outros sentimentos inferiores
que evidenciam a pequenez espiritual em que vivemos,
ludibriando-nos na posse de bens materiais e no prazer
da riqueza e do poder, tendo como roteiro de vida o
“eu”.
O egoísmo é um grande obstáculo para a reforma íntima.
Na cultura do “eu”, olhamos para as pessoas procurando
nós mesmos. Pela cortina do “eu”, não conseguimos
enxergar o nosso semelhante que necessita da nossa
ajuda.
Por outro lado, a importância da transformação moral
surge quando o ser humano constata que os prazeres da
vida material já não lhe satisfazem mais, estabelecendo
um marco para o despertar do Espírito em sua jornada de
ascensão na direção ao supremo bem.
Joanna de Ângelis, no
mesmo livro, comenta:
“Quando está desperto, lúcido para os objetivos
essenciais da existência, ergue-se, o indivíduo, e sai
do meio dos outros que estão mortos para a realidade.
(...) O despertar é inadiável, porque liberta e concede
autoridade para o discernimento. De tal forma se
apresenta a capacidade de entender, que uma visão
otimista e clara se torna a base do comportamento
psicológico, portanto, do mecanismo íntimo para a
aquisição da felicidade. Essa realização não se dá
somente quando tudo parece bem, mas sim quando sucedem
ocorrências que são convencionalmente denominadas como
infortúnios”.
Essa transformação moral e espiritual tem que ocorrer
dentro de nós, em um trabalho de melhoramento interior,
uma ação de dentro para fora, mediante um processo
contínuo de aprimoramento moral do Espírito para a sua
necessária evolução.
Contudo, a reforma íntima não se conquista da noite para
o dia. Demanda tempo, boa vontade, disciplina, esforço
incessante, muita resignação, luta contra as tendências
inferiores e, principalmente, estar vigilante para os
defeitos e ter foco na tarefa de melhorar.
Cada ser humano encontra-se em determinado estágio
evolutivo. Para identificar esse estágio, há que se
realizar um exame de consciência, um diagnóstico íntimo,
para identificar as reais circunstâncias da sua vida.
Certos de que não vamos parar a nossa evolução para
fazer a reforma íntima, ela deverá ser realizada durante
a presente existência. Não é esperar melhorar para
trabalhar. É trabalhar para melhorar.
A ação incessante de transformação moral é trabalho de
todo dia, de toda hora, e a vigilância deve ser
permanente, a fim de evitar tropeços e quedas. Logo,
será importante conservar uma atitude positiva, de
vigilância mental e emocional. Será impossível
melhorar-se moralmente sem sacrifícios ou renúncias.
Se cada ser humano mudar o seu comportamento, semeando a
paz dentro de si, eliminando os sentimentos inferiores,
contribuirá para a paz no planeta em uma ação de
fraternidade universal.
Abel Glaser, no livro “Fundamentos da reforma íntima”,
do Espírito Cairbar Schutel, no prefácio, comenta:
“Cada pessoa, para estar motivada a se conhecer,
admitindo erros ao menos para si mesma, precisa
exercitar a força de vontade inerente a todo ser humano,
mas muitas vezes adormecida. A motivação nesse percurso
nascerá do confronto da meditação com o cotidiano nem
sempre ideal que muitos adotam. Unindo, pois, a teoria à
prática, tendo por finalidade descortinar o ente cristão
que há por trás das barreiras insensíveis que o
materialismo impõe como regra geral na jornada terrena,
o indivíduo sentir-se-á mais leve quando praticar a
reforma íntima. (...)
Pessoas mais esclarecidas dos seus defeitos e melhor
empenhadas no processo de reforma íntima conseguem
conviver mais harmoniosamente entre si, alcançando maior
êxito em suas realizações.
Do estudo da autocrítica passou-se à análise do que leva
o ser humano a permanecer silente e impassível diante
dos erros e desvios que até pode admitir que possui. Se
sozinho não está conseguindo vislumbrar luz ao final do
túnel, haveria condições de auxiliá-lo de algum modo
eficaz? E a resposta resultou positiva, bastando que
houvesse interiorizado o impulso à melhora de caráter, à
escorreita formação da personalidade e,
fundamentalmente, existisse, forte e fiel, o desejo de
seguir os passos de Jesus. (...)
A reforma íntima deve ser compreendida como a chave
mestra para o sucesso de sua melhora interior e,
consequentemente, de sua felicidade exterior. (...)
Lapidar os próprios sentimentos é tarefa árdua, mormente
para o encarnado que não os têm em relativo
desenvolvimento, nem tampouco em contínuo exercício.
Reforma íntima sem amor no coração é, no entanto, uma
falácia. Aprender a cultivá-la verdadeiramente é um
exercício significativo de abnegação e submissão a Deus.
O egoísmo, por seu lado, é a raiz de todos os males
morais que existem no homem, fonte de todos os seus
desvios e vícios de comportamento e causa primária das
suas tendências negativas de toda ordem porque ele é a
negativa do mandamento maior: ‘amar a Deus sobre todas
as coisas e ao próximo como a si mesmo’. (...)
O processo de reforma íntima é, por certo, demorado e
delicado. Necessita de determinação e interesse
permanente daquele que o abraça para que alcance bons
frutos. O saldo positivo exige exercício de paciência,
tolerância, desprendimento, perdão, compreensão e amor
nas relações humanas.
A reforma íntima e seus fundamentos representam
verdadeira luz no imo da alma a todo encarnado que
pretende desenvolver-se espiritualmente ao longo da sua
trilha pela crosta terrestre.
Começar a reforma interior pelos problemas mais simples
é uma das fórmulas indicadas. Depois, com naturalidade,
os desvios mais complexos vão sendo enfrentados e
vencidos. Tudo a seu tempo e à sua hora. Sem
precipitação, mas com determinação, o homem alcança seus
objetivos”.
O Espírito Emmanuel, no livro “Pão nosso”, em “Combate
interior”, no Capítulo 178, na psicografia de Francisco
Cândido Xavier, escreveu:
“Tendo o mesmo combate que já em mim tendes visto e
agora ouvis estar em mim. – Paulo. (Filipenses, 1:30.)
Em plena juventude, Paulo terçou armas contra as
circunstâncias comuns, de modo a consolidar posição para
impor-se no futuro da raça. Pelejou por sobrepujar a
inteligência de muitos jovens que lhe foram
contemporâneos, deixou colegas e companheiros
distanciados. Discutiu com doutores da Lei e venceu-os.
Entregou-se à conquista de situação material invejável e
conseguiu-a.
Combateu por evidenciar-se no tribunal mais alto de
Jerusalém e sobrepôs-se a velhos orientadores do povo
escolhido. Resolveu perseguir aqueles que interpretava
por inimigos da ordem estabelecida e multiplicou
adversários em toda parte. Feriu, atormentou, complicou
situações de amigos respeitáveis, sentenciou pessoas
inocentes a inquietações inomináveis, guerreou pecadores
e santos, justos e injustos...
Surgiu, contudo, um momento em que o Senhor lhe convoca
o Espírito a outro gênero de batalha – o combate consigo
mesmo.
Chegada essa hora, Paulo de Tarso cala-se e escuta...
Quebra-se-lhe a espada nas mãos para sempre.
Não tem braços para hostilizar e sim para ajudar e
servir.
Caminha, modificado, em sentido inverso.
Ao invés de humilhar os outros, dobra a própria cerviz.
Sofre e aperfeiçoa-se no silêncio, com a mesma
disposição de trabalho que o caracterizava nos tempos de
cegueira.
É apedrejado, açoitado, preso, incompreendido muitas
vezes, mas prossegue sempre, ao encontro da Divina
Renovação.
Se ainda não combates contigo mesmo, dia virá em que
serás chamado a semelhante serviço.
Ora e vigia, prepara-te e afeiçoa o coração à humildade
e à paciência. Lembra-te, meu irmão, de que nem mesmo
Paulo, agraciado pela visita pessoal de Jesus, conseguiu
escapar”.
Sobre essa transformação
ocorrida com Paulo, Joanna de Ângelis, no livro “Vida:
desafios e soluções”, escreve: “O
apóstolo Paulo estava tão certo do valor do
despertamento da consciência, que em memorável carta aos
Efésios, conforme se encontra no capítulo cinco,
versículo catorze, conclamou: - Desperta, ó tu que
dormes, levanta-te entre os mortos e o Cristo te
esclarecerá. Isso porque sono é forma de morte, de
desperdício da oportunidade educativa, esclarecedora,
terapêutica, enriquecedora. E nesse sentido, quando se
está desperto, Jesus o esclarece, a fim de que avance
corajosamente na busca da sua autoidentificação”.
Assim, sem o conhecimento de nós mesmos e a luta contra
as nossas imperfeições, não há reforma íntima,
lembrando-se de que o processo de iluminação íntima
requer disciplina e esforços constantes, começando
dentro de nós.
Por isso, desperte agora e tenha a coragem de enfrentar
a si mesmo!
Bibliografia:
ÂNGELIS, Joanna de (Espírito), na
psicografia de Divaldo Pereira Franco. Vida: desafios
e soluções. 14ª Edição. Salvador/BA: LEAL, 2020.
EMMANUEL (Espírito); (psicografado por)
Francisco Cândido Xavier. Pão Nosso. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2018.
MOURA, Marta Antunes de Oliveira de
(organizadora). Estudo aprofundado da doutrina
espírita: Espiritismo, o consolador prometido por Jesus.
Livro IV. 1ª Edição. Brasília/DF: Federação Espírita
Brasileira, 2016.
SCHUTEL, Cairbar (Espírito); na
psicografia de Abel Glaser. Fundamentos da reforma
íntima. 11ª Edição. Matão/SP: Casa Editora O Clarim,
2011.
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