Natal na aldeia
Natal!… O trigo na azenha(1),
Água correndo a cantar!…
A lareira pede lenha,
Fagulhas brincam no ar.
Natal! Ah! saudade minha!…
Cantiga do coração!…
A taleiga de farinha
Amassa a estriga do pão.
Na sombra que envolve a Terra,
Oiteiros acendem lume.
Do bragal que se descerra
Chegam vagas de perfume.
À janela, erguem-se vozes…
— “Pastores ternos, quem sois?!…”
Meninos voam às nozes;
Quanta alegria depois!…
Na sala que se alvoroça,
Surge um velho sem ninguém.
Diz o dono: “A casa é vossa
E a mesa é vossa também…”
Próvida e grande candeia
Faz luz sob o teto morno;
Espalha-se em toda a aldeia
O alegre cheiro de forno.
Há canções claras e puras,
Nas sebes tintas de breu:
— “Glória ao Senhor nas Alturas!…
Hosanas!… Jesus nasceu!…”
Um mocho pia de leve
No velho beiral vizinho …
Não sei se é chuva ou se é neve
Que o vento lança ao caminho!…
Meia-noite!… Dons supremos!…
Calam-se os próprios lebréus.(2)
Roga a avozinha: — “Louvemos!…
Pai nosso que estás nos Céus!…”
Soluços da alma contente…
Doce visão do Natal!…
Deus vos salve eternamente,
Lembranças de Portugal!
(1) Azenha
- Moinho de roda movido por água.
(2) Lebréus
– cães de guarda ou de caça de lebre.
Do livro Antologia Mediúnica do Natal, obra
psicografada pelo médium Francisco Cândido Xavier.