Artigos

por Bruno Abreu

 

O sofrimento


Por que existe tanto sofrimento na vida? Por que as pessoas sofrem tanto?

Estou-me a referir ao sofrimento psicológico e não ao sofrimento físico, como a dor física que vem de um acidente ou doença.

Cada um de nós já passou pelo sofrimento, se não o estivermos a passar. São nuvens escuras que se atravessam no caminho e nós temos de chegar ao outro lado.

Existem duas formas de olharmos para o sofrimento, que são completamente distintas e nos levam a caminhos diferentes. Uma, que é a mais usada pela humanidade, é a de culpar os outros, a situação ou a vida. Infelizmente, esta traz-nos a um beco sem saída, pois colocamos o poder sobre o nosso sofrimento fora de nós e assumimo-nos como pobres coitados, vítimas das circunstâncias.

Esta ideia coloca-nos em uma rota sofredora, onde não existe escapatória, a não ser o tempo que mudará a situação. A visão que temos é que nada podemos fazer.

A outra forma é olharmos para dentro e percebermos a verdadeira causa do sofrimento. A mesma pessoa pode passar por situações semelhantes e as receber de forma diferente, pois estará emocionalmente diferente.

Existem muitos aspetos que podem alterar a forma como recebemos as situações. O principal é as emoções que estamos a viver. Se forem escuras, iremos perceber a situação como má, mas se estivermos num dia de felicidade a situação já não é tão má.

A vida é a vida, e, embora lutemos afincadamente para a manter sob controle, muitos dos dias percebemos que somos demasiado pequenos para controlar um movimento tão grande. É como querermos parar uma onda numa praia; podemos tentar, mas duvido que tenhamos sucesso.

O desejo de controlar a vida é a principal causa do sofrimento nesta.

Nós só sofremos quando não aceitamos as coisas como elas aparecem, seja através de outra pessoa, seja através de uma circunstância na vida ou uma situação com que nos deparamos.

Nossa educação desde novos é para lutarmos com a vida. Temos de vencer, não podemos perder. Embora exista alguma facilidade quando somos jovens, pois a maioria das preocupações estão com os pais e a preocupação do jovem é o de ter sucesso na escola, esta forma de estar, que incutimos de geração para geração, torna-se inquietante e sofredora.

O mestre Jesus deu-nos a receita para uma vida com menos sofrimento. Indulgência, resignação e fé.

Indulgência, em uma fase inicial, é a aceitação da outra pessoa como ela é. Nós queremos ter o direito à liberdade de podermos ser como achamos melhor, mas roubamos esse direito aos outros, tentando impor as nossas ideias sobre a vida e o que é certo e errado.

Como é fácil percebermos, os outros também querem ter o direito à sua liberdade e também são apegados a forma como idealizam a vida e seu próprio ser.

Estão a ver onde vai dar. Todas as guerras do nosso planeta, em especial as de princípio religioso, têm sua raiz neste problema. A falta de indulgência e a imposição dos seus certos e errados. O que expulsou Adão e Eva do paraíso e mantém-nos no “Inferno”, causado por nós.

Numa fase mais avançada da indulgência, não existe aceitação do outro como é, mas plena consciência de que a diferença é a realidade no ser humano e que não há nada a fazer. Ou seja, todos estão no sítio certo, a agir como sabem e nada a respeito disso, deve ser alterado. Os erros que cometemos são os professores de nosso caminho. Se o outro agiu erradamente, é porque necessita deste aprendizado. Esta é a consciência que se transforma em indulgência.

A resignação é a mesma forma de estar, como a indulgência, mas perante a vida.

Nada nos acontece por acaso e tudo o que nos aparece, seja através de alguém ou da vida, é porque necessitamos de vivenciar.

Esta postura perante a vida, evita que caiamos na indignação e percamos tempo, estrebuchando contra um acontecimento, levando-nos ao sofrimento.

Seja o que for, já aconteceu, já é passado. Permanecer em sofrimento, é agarrarmo-nos a esse passado, com a força que deveríamos usar para resolver a situação, se houver hipótese de resolução.

O sofrimento é parar no movimento da vida, a aceitação é continuar com a mente fresca para aprendermos com o que nos trouxe a vida. Esta é a enorme ajuda da resignação. Muitas das pessoas, olham a resignação como passividade. Esta não é passividade, é atenção, pois não fugimos do problema, a aceitação fortalece-nos para nos mantermos atentos a este, aprendermos com ele, para que possamos no futuro agir de forma diferente.

Percebermos que a vida é um movimento muito grande para caber dentro de nossa vontade e manipulação, é a aceitação desta como ela é. Jesus chamou de resignação.

Nos dois casos, indulgência e resignação, aprendemos uma forma de estar silenciosa e atenta perante a vida, onde percebemos a nossa pequenina dimensão. Isto evita a indignação que nos faz lutar com o que já aconteceu, sem qualquer hipótese de alterar o passado, criando o sofrimento em nós.

Aprendermos sobre este movimento e desenvolvermos uma forma de estar consciente do que podemos ou não fazer na vida leva-nos a um caminho de Fé racional.

A Fé é percebermos que o movimento da vida é um oceano, onde somos um peixe. Podemos escolher a nossa direção, mas não podemos mudar as correntes do mar.

A Fé também não é passividade, mas inteligência perante a vida. Esta só aparece quando compreendemos o movimento da vida e o nosso próprio movimento.

O sofrimento nasce porque não temos estas três virtudes em nós, permitindo que a indignação nos movimente, a nossa indignação, não a de mais ninguém.

Para além da indignação, a imposição de nossas ideias, que está intimamente ligado a esta indignação, é a causa de todo o sofrimento em nós.

 

Bruno Abreu reside em Lisboa, Portugal.


 

 

     
     

O Consolador
 Revista Semanal de Divulgação Espírita