O
sofrimento
Por que existe tanto
sofrimento na vida? Por
que as pessoas sofrem
tanto?
Estou-me a referir ao
sofrimento psicológico e
não ao sofrimento
físico, como a dor
física que vem de um
acidente ou doença.
Cada um de nós já passou
pelo sofrimento, se não
o estivermos a passar.
São nuvens escuras que
se atravessam no caminho
e nós temos de chegar ao
outro lado.
Existem duas formas de
olharmos para o
sofrimento, que são
completamente distintas
e nos levam a caminhos
diferentes. Uma, que é a
mais usada pela
humanidade, é a de
culpar os outros, a
situação ou a vida.
Infelizmente, esta
traz-nos a um beco sem
saída, pois colocamos o
poder sobre o nosso
sofrimento fora de nós e
assumimo-nos como pobres
coitados, vítimas das
circunstâncias.
Esta ideia coloca-nos em
uma rota sofredora, onde
não existe escapatória,
a não ser o tempo que
mudará a situação. A
visão que temos é que
nada podemos fazer.
A outra forma é olharmos
para dentro e
percebermos a verdadeira
causa do sofrimento. A
mesma pessoa pode passar
por situações
semelhantes e as receber
de forma diferente, pois
estará emocionalmente
diferente.
Existem muitos aspetos
que podem alterar a
forma como recebemos as
situações. O principal é
as emoções que estamos a
viver. Se forem escuras,
iremos perceber a
situação como má, mas se
estivermos num dia de
felicidade a situação já
não é tão má.
A vida é a vida, e,
embora lutemos
afincadamente para a
manter sob controle,
muitos dos dias
percebemos que somos
demasiado pequenos para
controlar um movimento
tão grande. É como
querermos parar uma onda
numa praia; podemos
tentar, mas duvido que
tenhamos sucesso.
O desejo de controlar a
vida é a principal causa
do sofrimento nesta.
Nós só sofremos quando
não aceitamos as coisas
como elas aparecem, seja
através de outra pessoa,
seja através de uma
circunstância na vida ou
uma situação com que nos
deparamos.
Nossa educação desde
novos é para lutarmos
com a vida. Temos de
vencer, não podemos
perder. Embora exista
alguma facilidade quando
somos jovens, pois a
maioria das preocupações
estão com os pais e a
preocupação do jovem é o
de ter sucesso na
escola, esta forma de
estar, que incutimos de
geração para geração,
torna-se inquietante e
sofredora.
O mestre Jesus deu-nos a
receita para uma vida
com menos sofrimento.
Indulgência, resignação
e fé.
Indulgência, em uma fase
inicial, é a aceitação
da outra pessoa como ela
é. Nós queremos ter o
direito à liberdade de
podermos ser como
achamos melhor, mas
roubamos esse direito
aos outros, tentando
impor as nossas ideias
sobre a vida e o que é
certo e errado.
Como é fácil
percebermos, os outros
também querem ter o
direito à sua liberdade
e também são apegados a
forma como idealizam a
vida e seu próprio ser.
Estão a ver onde vai
dar. Todas as guerras do
nosso planeta, em
especial as de princípio
religioso, têm sua raiz
neste problema. A falta
de indulgência e a
imposição dos seus
certos e errados. O que
expulsou Adão e Eva do
paraíso e mantém-nos no
“Inferno”, causado por
nós.
Numa fase mais avançada
da indulgência, não
existe aceitação do
outro como é, mas plena
consciência de que a
diferença é a realidade
no ser humano e que não
há nada a fazer. Ou
seja, todos estão no
sítio certo, a agir como
sabem e nada a respeito
disso, deve ser
alterado. Os erros que
cometemos são os
professores de nosso
caminho. Se o outro agiu
erradamente, é porque
necessita deste
aprendizado. Esta é a
consciência que se
transforma em
indulgência.
A resignação é a mesma
forma de estar, como a
indulgência, mas perante
a vida.
Nada nos acontece por
acaso e tudo o que nos
aparece, seja através de
alguém ou da vida, é
porque necessitamos de
vivenciar.
Esta postura perante a
vida, evita que caiamos
na indignação e percamos
tempo, estrebuchando
contra um acontecimento,
levando-nos ao
sofrimento.
Seja o que for, já
aconteceu, já é passado.
Permanecer em
sofrimento, é
agarrarmo-nos a esse
passado, com a força que
deveríamos usar para
resolver a situação, se
houver hipótese de
resolução.
O sofrimento é parar no
movimento da vida, a
aceitação é continuar
com a mente fresca para
aprendermos com o que
nos trouxe a vida. Esta
é a enorme ajuda da
resignação. Muitas das
pessoas, olham a
resignação como
passividade. Esta não é
passividade, é atenção,
pois não fugimos do
problema, a aceitação
fortalece-nos para nos
mantermos atentos a
este, aprendermos com
ele, para que possamos
no futuro agir de forma
diferente.
Percebermos que a vida é
um movimento muito
grande para caber dentro
de nossa vontade e
manipulação, é a
aceitação desta como ela
é. Jesus chamou de
resignação.
Nos dois casos,
indulgência e
resignação, aprendemos
uma forma de estar
silenciosa e atenta
perante a vida, onde
percebemos a nossa
pequenina dimensão. Isto
evita a indignação que
nos faz lutar com o que
já aconteceu, sem
qualquer hipótese de
alterar o passado,
criando o sofrimento em
nós.
Aprendermos sobre este
movimento e
desenvolvermos uma forma
de estar consciente do
que podemos ou não fazer
na vida leva-nos a um
caminho de Fé racional.
A Fé é percebermos que o
movimento da vida é um
oceano, onde somos um
peixe. Podemos escolher
a nossa direção, mas não
podemos mudar as
correntes do mar.
A Fé também não é
passividade, mas
inteligência perante a
vida. Esta só aparece
quando compreendemos o
movimento da vida e o
nosso próprio movimento.
O sofrimento nasce
porque não temos estas
três virtudes em nós,
permitindo que a
indignação nos
movimente, a nossa
indignação, não a de
mais ninguém.
Para além da indignação,
a imposição de nossas
ideias, que está
intimamente ligado a
esta indignação, é a
causa de todo o
sofrimento em nós.
Bruno
Abreu reside em Lisboa,
Portugal.
|