Em certas interações espíritas a respeito de conceitos,
princípios, fenômenos, interpretações e comportamentos,
não raro, há posicionamentos conflitantes, os quais
ficam dentro de uma normalidade em se tratando de
estudos, entendimentos doutrinários e opiniões pessoais.
Natural a falta de consenso, porquanto algumas dúvidas
são decorrentes da própria dinâmica das revelações
espíritas, que se vão completando diante de fatos e
fenômenos, cujas verdades ainda não podem ser provadas,
mas que serão esclarecidas conforme a evolução
intelectual, moral e espiritual, que impulsionará a
capacidade de assimilação de novos conhecimentos que
suportarão o progresso a caminho da perfeição.
Outros pontos conflitantes envolvem questões de
circunstâncias do momento em que se vive nas
experiências terrenas, as quais são eivadas de polêmicas
diante das diferentes visões de mundo, porquanto cada um
tem a sua percepção em relação a determinado fato, cujo
entendimento é carregado dessas visões.
Das desavenças, o preocupante não é o conflito de
entendimentos e visões, mas a decorrente cisão e o
afloramento de sentimentos, atitudes e comportamentos
contrários aos princípios morais e éticos espíritas,
agindo conforme argumentos transitórios de concepções
puramente humanas. Conflitos morais e éticos são sinais
de que algo não vai bem.
Os espíritas, diante de compreensões conflituosas,
precisam identificar o que é essencial, deixando de se
contaminar por sentimentos que distorcem a fé
raciocinada.
Nas desavenças segregadoras, perde-se o foco do
Espiritismo como “O Consolador Prometido”, representado
pela Codificação Espírita, de Allan Kardec, que foi
presidida pelo Espírito de Verdade com o auxílio de
Espíritos Superiores, desvendando as coisas espirituais
que o homem não pode descobrir por si mesmo.
Importante recordar que a Codificação Espírita é uma
construção coletiva, formado pelo conjunto dos seres do
mundo espiritual, cada um trazendo o contributo de suas
luzes aos homens, para lhes tornar conhecido esse mundo
e a sorte que os espera.
A Doutrina Espírita não foi ditada completa, nem imposta
à crença cega, porque é deduzida pelo trabalho do homem,
da observação dos fatos que os Espíritos põem sob os
nossos olhos e as instruções que nos dão. As revelações
são incessantes, complementares e acumulativas de
conhecimentos, sendo transmitidas por diversos meios e
médiuns.
Jesus revelou a verdade divina pela palavra, que liberta
os que creem e praticam os seus ensinamentos e exemplos
como roteiros de vida.
A verdade de Deus é absoluta, única, eterna e imutável.
Para o ser humano, o conhecimento da verdade divina é
proporcional à sua evolução moral, intelectual e
espiritual, sendo que as revelações espíritas sempre
ocorrerão quando pudermos assimilar e suportar seus
conteúdos. Portanto, o conhecimento da verdade divina
tem relação com o estágio evolutivo e a capacidade de
compreendê-la.
A despeito da condição evolutiva de cada um, são
inadequados os debates que desviem os trabalhadores
espíritas do serviço a ser realizado junto aos seus
semelhantes.
A esse respeito, vieram-me à mente as palavras de
Francisco Cândido Xavier: “Se Allan Kardec tivesse
escrito que fora do Espiritismo não há salvação, eu
teria ido por outro caminho. Graças a Deus, ele escreveu
fora da caridade, ou seja, fora do Amor, não há
salvação.”
O Espiritismo foca a prática da caridade como o
principal meio de salvar a alma e promover o progresso
moral e espiritual do ser humano.
O Espírito Emmanuel, no livro Pão Nosso,
psicografado por Francisco Cândido Xavier, alerta na
mensagem “No serviço cristão” para questões essenciais,
em que determinados trabalhadores, aprendizes ou grupos
espíritas concentram seus esforços em outros assuntos ou
fenômenos que não conduzem para a transformação moral do
ser humano.
Emmanuel ensina:
“Não falta quem veja no Espiritismo mero campo de
experimentação fenomênica, sem qualquer significação de
ordem moral para as criaturas.
Muitos aprendizes da consoladora Doutrina, desse modo,
limitam-se às investigações de laboratório ou a
discussões filosóficas. (...)
Não vale pesquisar recursos que não nos dignifiquem.
(...)
Não adianta guardar a certeza na sobrevivência da alma,
além da morte, sem o preparo terrestre na direção da
vida espiritual. E nesse esforço de habilitação, não
dispomos de outro guia mais sábio e mais amoroso que o
Cristo.
Somente à luz de suas lições sublimes é possível
reajustar o caminho, renovar a mente e purificar o
coração. (...)
O problema não é apenas de saber. É o de reformar-se
cada um para a extensão do bem.
Afeiçoemo-nos, pois, ao Evangelho sentido e vivido,
compreendendo o imperativo de nossa iluminação interior,
porque (...) ‘todos devemos comparecer ante o tribunal
do Cristo, a fim de recebermos, de acordo com o que
realizamos, estando no corpo, o bem ou o mal’.”
Emmanuel chama atenção para os debates secundários que
não conduzem para a transformação moral das pessoas.
As consequências dos esclarecimentos espíritas devem
estimular a reforma íntima e a prática do bem para a
construção do reino de Deus dentro de nós mesmos. Por
isso, imprescindível caminhar com Jesus pelas verdades
divinas que libertam a alma.
A Doutrina Espírita mostra o caminho a ser seguido em um
longo processo evolutivo com base na pluralidade de
existências, e a mensagem cristã de merecimento segundo
nossas obras estimula o trabalho e o esforço individual
como mola propulsora da construção do saber e da
moralização.
O espírita deve dar exemplo, confiabilidade e autoridade
àquilo que prega e difunde. A retidão de comportamento,
atitude e procedimento no caminho do bem e da caridade
terá efeito aglutinador pelo exemplo de fé, esperança e
confiança em Deus e no Mestre Jesus.
Não se pode perder o foco do lema espírita: “fora da
caridade não há salvação!”
Paulo de Tarso, na 1ª Epístola aos Coríntios (13:1 a 7 e
13), coloca a caridade acima até da fé, que está ao
alcance de todos, independentemente de suas crenças:
“Ainda quando eu falasse todas as línguas dos homens e a
língua dos próprios anjos, se eu não tiver caridade,
serei como o bronze que soa e um címbalo que retine;
ainda quando tivesse o dom de profecia, que penetrasse
todos os mistérios, e tivesse perfeita ciência de todas
as coisas; ainda quando tivesse toda a fé possível, até
o ponto de transportar montanhas, se não tiver caridade,
nada sou. E, quando houvesse distribuído os meus bens
para alimentar os pobres e houvesse entregado meu corpo
para ser queimado, se não tivesse caridade, tudo isso de
nada me serviria. A caridade é paciente; é branda e
benfazeja; a caridade não é injubilosa; não é temerária,
nem precipitada; não se enche de orgulho; não é
desdenhosa; não cuida de seus interesses; não se agasta,
nem se azeda com coisa alguma; não suspeita mal; não se
rejubila com a injustiça, mas se rejubila com a verdade;
tudo suporta, tudo crê, tudo espera, tudo sofre. Agora,
estas três virtudes: a fé, a esperança e a caridade
permanecem; mas, dentre elas, a mais excelente é a
caridade.”
O Espírito Joanna de Ângelis, no livro Mundo
regenerado, psicografado por Divaldo Pereira Franco,
no capítulo 17, em “Caridade do amor”, ensina:
“Jesus viveu a caridade total no silêncio, na renúncia,
nas mãos sempre distendidas para ajudar, na entrega da
Sua pela nossa existência.
Nunca te afastes da caridade de Jesus, da caridade do
amor.
Tenta fazer a tua parte, seguindo-Lhe o exemplo de
abnegação e devotamento. (...)
Asserena-se, pois, e exercita a caridade silenciosa do
amor.”
O atual momento de transição planetária exige
perseverança e vigilância por parte dos trabalhadores
espíritas para não se desviarem do caminho da prática do
amor na forma da caridade, principalmente acerca de
questões polêmicas circunstanciais de relevância
temporária, própria de seres humanos imperfeitos em
processo evolutivo.
O Evangelho de Jesus é o Código Moral dos cristãos, que
se fundamenta na lei de Deus, na lei maior do amor, e a
moral que a Doutrina Espírita ensina é a de Jesus
Cristo.
Para sermos considerados discípulos de Jesus é
necessário o desenvolvimento de valores morais cristãos.
Por conseguinte, devemos buscar o que é essencial.
Em O Evangelho Segundo o Espiritismo, de Allan
Kardec, no Capítulo XVII, “Sede perfeitos”, em “Os bons
espíritas”, temos:
“O Espiritismo não institui nenhuma nova moral; apenas
facilita aos homens a inteligência e a prática da do
Cristo, facultando fé inabalável e esclarecida aos que
duvidam ou vacilam. (...) Reconhece-se o verdadeiro
espírita pela sua transformação moral e pelos esforços
que emprega para domar suas inclinações más.”
Por esses motivos, ao invés de cultuar cisões
decorrentes de questões secundárias, o importante será
unir esforços no trabalho edificante na prática do bem,
com fundamento no Evangelho Redivivo de Jesus e nos
princípios de O Consolador Prometido.
Para tanto, será preciso cultuar a vigilância de
atitudes e comportamentos para não se desviar do caminho
da luz.
A força do Espiritismo não está na individualidade, em
certo grupo ou na entidade. Ela está na própria
Codificação Espírita e nas consequências morais e éticas
que ela estimula e desenvolve.
Divergência de opinião e interpretações sempre haverá,
mas que sejamos unidos pelo lema “fora da caridade
não há salvação”, como instrumento de transformação
moral e espiritual de cada ser humano na busca da
fraternidade universal e da perfeição.
Bibliografia:
ÂNGELIS, Joanna (Espírito); psicografado
por Divaldo Pereira Franco. Mundo regenerado. 1ª
Edição. Salvador/BA: Editora LEAL, 2023.
EMMANUEL (Espírito); (psicografado por)
Francisco Cândido Xavier. Pão Nosso. 1ª Edição.
Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira, 2018.
KARDEC, Allan; tradução de Guillon
Ribeiro. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 1ª
Edição. Brasília/DF: Federação Espírita Brasileira,
2019.