A diferença entre conhecer a verdade e
compreendê-la
Conta-nos a História que na época de Jesus a Palestina
estava dividida em diversas camadas sociais e grupos
político-religiosos, com destaque para a aristocracia e
os sacerdotes, que nem sempre se entendiam. Existia uma
camada social formada pelos chamados fariseus,
conhecidos pela sua rigorosa observância da Lei e
Tradições Judaicas.
Eles eram responsáveis por estudar os antigos
testamentos e antigas escrituras para dar a elas a
interpretação mais apropriada. A diversidade de grupos
religiosos, sociais e políticos criava um ambiente
complexo e muitas vezes conflituoso na Palestina na
época de Jesus.
A preocupação dos fariseus era extrair das antigas
escrituras um conhecimento de ordem moral para guiar a
população, levando em conta que eles também tinham uma
posição privilegiada economicamente e, por terem acesso
ao Sinédrio, uma espécie de suprema corte judaica em
Jerusalém, atuando como um conselho judiciário e
legislativo. Era composto por uns 72 membros, incluindo
sumos sacerdotes, anciãos e escribas. O Sinédrio tinha
autoridade para julgar questões religiosas e legais, mas
seu poder era limitado pelo Império Romano.
Alguns desses fariseus eram também conhecidos pela sua
cultura e seu elevado caráter, chamados de Doutores da
Lei e entre eles podemos destacar Nicodemos, um
personagem muito conhecido na história bíblica por ter
procurado o Mestre em busca de uma melhor compreensão
com relação às antigas escrituras e às curas realizadas.
Nicodemos não era um indivíduo comum, além de ser um
homem culto, conhecedor das antigas leis mosaicas, era
um personagem importante para aquela cultura. Ele
percebeu intuitivamente que, para Jesus realizar os
fenômenos de cura, ajudar os necessitados e aflitos, só
era possível com um dom concedido por Deus.
Dessa forma Nicodemos resolve procurar Jesus e pede ao
Mestre o esclarecimento que ele precisava para entender.
Apesar de ser um Doutor da Lei em Jerusalém, havia
situações que para ele não faziam sentido.
No livro Boa Nova, psicografado por Chico Xavier,
o espírito Irmão X procura apresentar o seguinte diálogo
entre Nicodemos e Jesus:
“– Mestre, bem sabemos que vindes de Deus, pois somente
com a luz da assistência divina poderíeis realizar o que
tendes efetuado, mostrando o sinal do céu em vossas
mãos. Tenho empregado minha existência em interpretar a
lei, mas desejava receber vossa palavra sobre os
recursos de que deverei lançar mão para conhecer o Reino
de Deus!
O Mestre sorriu bondosamente...” 1
Jesus percebendo a sensibilidade nas palavras de
Nicodemos, procurou dentro do contexto da época e das
limitações culturais explicar o verdadeiro sentido da
seu messianato, que não era um privilégio concedido por
Deus:
Nicodemos, não basta que tenhas vivido a interpretar a
lei. Antes de raciocinar sobre as suas disposições,
deverias ter-lhe sentido os textos. Mas, em verdade devo
dizer-te que ninguém conhecerá o reino do céu, sem
nascer de novo. 1
O mestre realizava prodígios, porém explicar sua
verdadeira missão era uma tarefa complicada, pois se nem
um Doutor da Lei percebia a extensão do ensinamento do
Cristo, os homens comuns teriam muita dificuldade em
compreender o verdadeiro sentido da vida futura ou
reencarnação.
Cairbar Schutel desenvolve uma reflexão sobre “Os
Ensinos de Jesus” para entendermos melhor o possível
desdobramento da conversa entre Nicodemos e o Cristo,
escrevendo:
O que faltava, pois, a Nicodemos para se tornar cristão,
para seguir a Jesus? Desde que ele acreditava nos fatos,
nos fenômenos, como os chamamos hoje; desde que achava
que esses fatos eram autorizados por Deus, não os
atribuindo à origem diabólica, por que não se apresentou
logo como um dos discípulos do Nazareno? Isto quer dizer
que não basta crer nos milagres, nos fatos, nas curas
que assinalam, por certa forma, o Cristianismo, para
sermos cristãos. Precisamos também crer na palavra, na
doutrina que Jesus pregava. 2
Ao longo de todo mandato mediúnico de Chico Xavier,
Emmanuel nos apresentou mensagens escolhidas
oportunamente, que foram reunidas em várias obras pela
FEB e intituladas por “O Evangelho Segundo Emmanuel”,
onde encontramos uma passagem do Apóstolo João, quando
comentou:
“A palavra de Jesus a Nicodemos foi suficientemente
clara. Desviá-la para interpretações descabidas pode ser
compreensível no sacerdócio organizado, atento às
injunções da luta humana, mas nunca nos espíritos
amantes da verdade legítima. A
reencarnação é lei universal.” 3
Não podemos ter dúvida que a interpretação das palavras
do Mestre poderia variar de acordo com o momento
histórico e a cultura dos indivíduos.
Allan Kardec percebe que existia uma dificuldade ou
limitação muito grande das pessoas alcançarem o
verdadeiro sentido das palavras de Jesus quando ele
tentava falar sobre vida eterna e imortalidade da alma,
até mesmo com os apóstolos. Dessa forma procura melhor
organizar nosso pensamento destacando a seguinte
passagem bíblica:
“Falo-lhes por parábolas, porque não estão em condições
de compreender certas coisas. Eles veem, olham, ouvem,
mas não entendem. Fora, pois, inútil tudo dizer-lhes,
por enquanto. Digo-o, porém, a vós, porque dado vos foi
compreender estes mistérios. Procedia, portanto, com o
povo, como se faz com crianças cujas ideias ainda se não
desenvolveram.” (Mateus 13:11-16) 4
Jesus sabia que nem todos teriam o alcance espiritual
para perceber o verdadeiro sentido das suas palavras e
dessa forma procurou deixar parábolas com histórias de
profundo senso de ordem moral. As pessoas não
entenderiam inicialmente as parábolas, mas com o tempo
perceberiam a mensagem oculta nas histórias, um duplo
sentido que com o tempo se revelaria. O conhecimento da
verdade é o primeiro grande passo para nossa
transformação, já a compreensão implica em um amadurecimento
do senso moral da Humanidade.
Bibliografia:
1) Xavier,
Francisco Cândido; Boa Nova (1940); Cap. 14 - A
lição a Nicodemos; FEB.
2) Schutel,
Cairbar; Parábolas e Ensinos de Jesus (1928);
Colóquio de Jesus com Nicodemos; Ed. O Clarim.
3) Xavier,
Francisco Cândido; O Evangelho Segundo Emmanuel (2015);
Comentários ao Evangelho Segundo João 3:7; Ed. FEB.
4) Kardec,
Allan; O Evangelho Segundo o Espiritismo; Cap.:
XXIV -Por que fala Jesus por parábolas - item 4; Ed.
FEB.
5) FEB-tv
(Orientações de Jesus a Nicodemos)
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