A
noite escura da
alma
Em poesia, há
caminhos que só
podem ser
trilhados com os
olhos fechados e
o coração
desperto. São
veredas
interiores que
nos chamam para
além do tempo,
onde o eco do
próprio ser
vibra
suavemente,
convidando-nos
ao reencontro
com a essência
divina que
habita em nós.
Quem ousa
atravessá-las
precisa
desapegar-se das
certezas humanas
e mergulhar na noite
dos sentidos, de
que falava São
João da Cruz,
onde as estrelas
não se veem com
os olhos, mas se
reconhecem na
luz secreta da
alma.
O poema que
apresentamos a
seguir,
inspirado no
livro Luz no
Caminho, de
Mabel Collins, é
uma dessas
travessias.
Nele, cada verso
é um passo na
escada invisível
que liga o
humano ao eterno
e o transitório
ao absoluto.
Aqui, o leitor
não é mero
espectador: é
chamado a
aspirar ao
silêncio, a
vencer as feras
interiores, a
diluir as
sombras do ego
para tornar-se
receptáculo da Voz
sem som.
Quem lê,
sente-se
convidado a
escutar o
próprio destino.
Como todo rito
de iniciação, a
caminhada exige
renúncia e
coragem. É
preciso aprender
a não chorar,
não por dureza,
mas por
transcendência;
calar para ouvir
o Verbo; amar
para ascender;
doar-se para
ser. Em cada
imagem, o poema
convida o
aspirante a
erguer-se sobre
si mesmo, a
libertar-se da
prisão da
matéria e a
expandir-se na
vertical
infinita da
consciência.
E, ao final,
quando a alma
compreende que
tudo o que
buscava podia
ser encontrado
dentro de si, o
horizonte se
desfaz: não há
mais separação
entre o que vê e
o que é. Quem
atravessa os
Portais Divinos
descobre que não
se trata de
chegar a um
lugar, mas de
tornar-se o
próprio caminho.
É nesse ponto
que o poema toca
o nirvana
mental – e,
se o leitor
permitir, a sua
leitura será
também um ato de
transformação.
ANTE OS PORTAIS
DIVINOS
Na caminhada
para o alvorecer
A Alma humana
anseia despertar,
Mas antes que
seus olhos
possam Ver,
Têm de ser
incapazes de
chorar.
E não chorar não
é dureza insana
De um pétreo
coração, frio,
desamante:
É haver vencido
a natureza
humana,
Que o jogo das
paixões torna
inconstante.
Até que o
Iniciante possa Ouvir,
Tem de perder a
sensibilidade,
Fechar-se ao
mundo externo e
então se abrir
À Voz de Deus,
sem som, na internidade.
Se insensível
tornar-se ao
ruído
Do “eu”
inferior, por
certo vence-o:
Não mais o afeta
o som que afeta
o ouvido,
E adentra a
soledade do
Silêncio.
Até que sua voz
possa Falar
Na presença
divina do
Senhor,
Tem de ser
incapaz de
magoar
A seu irmão,
segundo a Lei do
Amor.
Os Grandes Seres
doam o coração
E querem o
Aspirante agindo
assim:
Não só não
magoar, mas,
como irmão,
Soerguer, amar,
prover, doar-se
enfim.
E para coroar
seus dons
sagrados
E assim, um
dia, Erguer-se ante
Jesus,
O Ser tem de
lavar os pés
cansados
No sangue de seu
coração em luz.
Lavar os pés no
sangue – isto
é, o princípio
Criador do ser
humano – é
alforriar-se
Da Humanidade,
de que era
mancípio,
E aos Páramos de
Luz em luz
alar-se.
Ver,
pois, Ouvir, Falar e,
após, se
Erguer
Ante o Senhor,
com a Alma feita
em luz:
Eis as etapas
que há de
percorrer
O verdadeiro
Postulante à
cruz.
É a “noite dos
sentidos”...
bênção ou trauma
Do Ser que
imerge em si e
se encarcera,
Em confronto com
as feras de sua
Alma...
Não raro – dizem
os mestres –, vence
a fera.
Sejamos claro:
feras do
egoísmo,
Do orgulho, da
ambição, da
falsidade...
A lista é
imensa... e
“abismo chama
abismo”,
Como bondade
sempre atrai
bondade.
Mas se triunfar
a fé, potente e
cálida,
Sobre os
demônios em
fatal vendeta,
A lagarta
transforma-se em
crisálida
E a crisálida,
enfim, em
borboleta...
Nenhum Mentor
lhe poderá valer
Nos rudes passos
iniciais,
tristonhos:
Ante os Portais, porém,
praz-lhe
entrever
A túnica
inconsútil de
seus sonhos...
Não viver no
presente ou no
futuro
Ou no passado – só
viver no Eterno.
Esta é a senda
perfeita – o
mais seguro,
Mais glorioso
caminho, mais
interno.
Entrai, pois, no
Silêncio...
a mais bendita
Fonte de Paz e
Força
onipotente,
Onde a Alma sabe
que o que é seu
gravita
Ao seu encontro,
inexoravelmente.
Estas são Chaves
de Iniciação
Que vêm de
arcanos
imemoriais,
E aquele que as
viver no
coração,
Não morrerá – disse
Jesus – jamais!
Mário Frigéri é
poeta, escritor,
autor e youtuber
com a mente e o
coração voltados
para o esplendor
do Evangelho e
da Doutrina
Espírita.
Campinas-SP.