Raul de Mello
Franco Jr.:
”O Espiritismo
nos ensina
a ver
as coisas além
de
suas
aparências”
Promotor de
Justiça e
professor de
Direito
Constitucional
em
Araraquara-SP, o
confrade fala
sobre os
objetivos e a
atuação da AJE -
Associação
Jurídico-Espírita
do Estado de São
Paulo
|
Raul de Mello
Franco Jr.
(foto),
espírita desde
os 25 anos de
idade, natural
de São Paulo-SP,
atualmente
residente em
Araraquara-SP, é
Promotor de
Justiça e
professor de
Direito
Constitucional
na Uniara -
Centro
Universitário de
Araraquara.
Formado em
Filosofia e
Direito, com
pós-graduação e
mestrado em
Direito, o
confrade é autor
de vários livros
na área
jurídica. No
movimento
espírita, tem
atuado como
palestrante e é
também
integrante da
AJE – Associação
Jurídico-Espírita
do Estado de São
Paulo, cuja
origem e
atividades
constituem o
tema
|
principal da
presente
entrevista.
Quando foi
fundada a AJE?
|
A AJE –
Associação
Jurídico-Espírita
do Estado de São
Paulo - foi
fundada em março
de 2008, na sede
da USE, na
Capital do
Estado. Entidade
sem fins
lucrativos,
congrega
advogados,
juízes,
promotores,
procuradores,
delegados de
polícia,
defensores
públicos, servidores
da Justiça e dos
órgãos
policiais,
professores e
acadêmicos de
Direito, enfim,
pessoas que,
direta ou
indiretamente,
trabalham na
área jurídica e
que se dispõem a
debater, à luz
da doutrina
espírita (e,
portanto, à luz
da doutrina
cristã),
questões que
permeiam as
lides forenses.
Qual a
finalidade da
Associação?
Divulgar a
doutrina
espírita e
contribuir para
o aprimoramento
moral e
espiritual dos
operadores do
Direito
espíritas e
demais
interessados,
auxiliando-os no
progresso
individual. Com
isso, também
busca promover a
paz e a
espiritualização
dos meios
forenses,
comumente
marcados pelo
materialismo e
pela
hostilidade. Mas
também se propõe
a contribuir
para o
aperfeiçoamento
da legislação, a
prestar
assessoria
jurídica
preventiva e
consultiva às
casas e
instituições
espíritas,
posicionar-se,
publicamente e
com base na
doutrina
espírita, acerca
de temas e fatos
sociais e
juridicamente
relevantes etc.
Como a AJE
surgiu? Ela está
presente em todo
o país?
Inspirada pela
Associação
Médico-Espírita
(AME), a AJE-SP
nasceu da
iniciativa de um
grupo de
aproximadamente
50 pessoas
ligadas ao
Direito. Foi
precedida pelas
AJE-RS e AJE-ES.
Hoje existem
instituições
semelhantes em
vários outros
Estados. A
AJE-SP promoveu,
em 2010, o seu
primeiro
CONJURESP -
Congresso
Jurídico-Espírita,
em Ribeirão
Preto-SP. O tema
central
escolhido foi
“Ética, Justiça
e Espiritismo”.
Na oportunidade,
foi lançada a
obra “Direito e
Espiritismo” e
criada a
AJE-Brasil que
tem entre os
seus objetivos
fomentar e dar
suporte para a
criação de novas
AJEs em outras
unidades da
federação ou
regiões.
No caso
paulista,
quantos são os
associados?
A AJE paulista
conta hoje com
aproximadamente
220 associados.
Está estruturada
em oito núcleos
regionais nas
cidades de Araraquara, Campinas, Franca, Osasco,
Ribeirão Preto,
São José dos
Campos, São José
do Rio Preto e
Sorocaba.
Todos os núcleos
são muito
atuantes e a
manutenção
material dessa
estrutura dá-se,
basicamente,
através das
anuidades dos
associados,
doações, vendas
de livros
e de DVDs.
Como a AJE São
Paulo tem
atuado?
A AJE-SP promove
encontros na
Capital e em
diversas cidades
do interior
paulista, sempre
propondo debates
que mesclam
temas jurídicos,
éticos,
filosóficos e
religiosos. Por
exemplo: um dos
encontros serviu
para abordar o
tema “É possível
exercer
autoridade com
humildade?” À
brilhante
palestra
proferida por um
Juiz de Direito,
seguiu-se
interessante
debate, com
ampla
participação dos
presentes. Os
palestrantes
são, quase
sempre,
profissionais do
Direito. Gente
que assume
gastos pessoais
para se deslocar
pelo Estado por
amor a essa
causa. Os
encontros são
sempre abertos e
gratuitos.
Alguns são
gravados em DVD,
o que permite a
reprodução em
outros Núcleos e
a venda aos
interessados, no
sítio da AJE na internet (www.ajesaopaulo.com.br).
Esses núcleos
trabalham apenas
com a
organização de
encontros?
Os Núcleos
trabalham de
duas formas:
organizam
eventos
semestrais,
voltados para
toda a
comunidade.
Através de
palestras e
seminários,
todos os
operadores do
Direito e
membros da
comunidade são
convidados a
refletir sobre
um tema
proposto. Além
disso, os
Núcleos possuem
grupos de
estudos com
reuniões mensais
ou quinzenais.
Neles há o
estudo
sistemático de
obras
jurídico-espíritas,
inclusive
aquelas
produzidas pela
própria
Associação. Em
Araraquara, por
exemplo, o grupo
de estudos
ocupou-se, no
último semestre,
da análise das
obras “A
filosofia penal
dos espíritas”
(Fernando Ortiz)
e “Direito e
Espiritismo”
(vários autores
– publicação
AJE-SP). A AJE,
através de seus
órgãos
diretivos,
também
organiza estudos,
cursos,
simpósios,
seminários,
conferências,
congressos,
publicações, reportagens,
encontros de
dirigentes de
vários Estados,
firma parcerias
etc. Para 2012
já está sendo
organizado o II
Congresso
Jurídico-Espírita,
o qual deverá
acontecer em
Campinas-SP, no
mês de junho.
Como professor
na área do
Direito e
promotor de
justiça, de que
forma analisa a
vinculação do
Direito com a
grandeza da
doutrina
espírita?
O Espiritismo
ensina a ver as
coisas além das
suas aparências
e compreender a
razão mais
profunda dos
acontecimentos
da vida. O
Direito, como
ciência social,
trabalha com
esses mesmos
fatos. A AJE
alerta para a
necessidade de
se enxergar além
da Constituição,
dos códigos e
das leis. Nas
lides forenses
existem razões
maiores,
aparentemente
invisíveis, que
devem ser
reveladas pela
reflexão de seus
operadores. Os
conflitos que
chegam à Justiça
não podem ser
encarados como
fatos
ocasionais,
acidentes
sociais, meros
desajustes.
Mesmo o encontro
de pessoas,
partes,
advogados,
juízes,
promotores,
defensores
etc., dentro de
um mesmo
processo, não
deve ser
atribuído ao
acaso. O
processo revela
muito mais do
que aquilo que
está no papel, e
do operador do
Direito,
espiritualizado,
exige-se a
argúcia para
captar essas
realidades e
esgrimir
soluções mais
condizentes com
a lei que a tudo
rege: a lei de
Deus.
Atualmente, com
tantos
profissionais da
área jurídica
adeptos do
Espiritismo,
considera que
isso tem trazido
alterações e
benefícios no
cumprimento da
Lei?
Trabalhar com
profissionais
dotados dos
referenciais
doutrinários do
Espiritismo é um
avanço, em
qualquer área do
conhecimento
humano. O
jurista espírita
não limita a sua
visão e os seus
propósitos ao
quadrado
materialista e
minimalista do
processo.
Consegue vislumbrar
as suas causas
mais profundas
e, com isso,
lutar por
desfechos mais
justos. Quem tem
consciência de
que suas
responsabilidades
ultrapassam as
fronteiras do
contrato, dos
honorários e dos
subsídios pagos
pelo Estado, age
impulsionado por
valores que são
verdadeiros.
Recusa-se a
compactuar com
causas injustas
e mira a sua
atividade
profissional
para outros
tesouros:
aqueles a que se
referia Jesus.
Hoje é possível
sentir uma
mudança salutar
na área do
Direito. A
própria AJE é um
sinal inequívoco
dessa mudança.
Ainda é uma
semente, um
primeiro raio de
sol lançado num
cenário lúgubre
e habitualmente
alheio aos
fatores
espirituais que
cercam as
criaturas. Mas
nós, cristãos
espíritas, temos
consciência de
que somos
pequena porção,
como o “sal” ou
o “fermento”,
porém, com
enorme poder de
transformação a
que não podemos,
inconsequentemente,
renunciar.
A evolução da
mentalidade
humana, com
adoção crescente
da fraternidade
e do respeito às
diferenças,
tem-se refletido
na seara do
Direito?
A lei do
progresso parece
clara nesses
campos. Vivemos
uma sociedade
mais aberta e
solidária, cada
vez mais cônscia
de que deve
lutar por ideais
de igualdade.
Esse mesmo
avanço é
possível
enxergar na
legislação
humana e nas
decisões
judiciais.
Valores como a
solidariedade, a
fraternidade, a
afetividade, que
em outras épocas
poderiam ser
encarados apenas
como parcelas de
um humanismo
filosófico ou
religioso,
chegam à
Justiça. Basta
examinar a
dimensão
protetiva dos
direitos
sociais, do
Estatuto da
Criança e do
Adolescente, do
Estatuto do
Idoso, das leis
previdenciárias,
das recentes
decisões no
âmbito do
Direito de
Família para se
aquilatar que
uma revolução
silenciosa e
basilar está se
processando. Vou
exemplificar: em
recente decisão
do Superior
Tribunal de
Justiça, em
processo onde o
pai biológico e
legal
reivindicava,
contra o pai
afetivo, a
guarda de uma
criança, acabou
por prevalecer a
superioridade
dos laços da
paternidade
afetiva. O
primeiro era o
pai indicado na
certidão de
nascimento; o
segundo era a
pessoa que havia
cuidado da
criança por
vários anos e
quem ela, de
fato, reconhecia
como pai. Em
outras épocas,
ninguém ousaria
dizer que o pai
biológico e
documental não
poderia fazer
prevalecer o seu
direito que
decorre da
certidão pública
e da genética.
Hoje a
afetividade
desponta, com
reconhecimento
formal da
Justiça, como
valor que está
acima de tudo
isso.
Nos recentes
eventos
promovidos pela
AJE, inclusive
com fornecimento
de certificado
de participação,
quais as
repercussões
sentidas?
O Núcleo de
Araraquara, que
está sob a minha
coordenação,
teve uma
experiência
gratificante
nestes três
últimos
semestres. Com o
apoio da
universidade
onde leciono
(cuja direção
teve
sensibilidade
para apreender
os propósitos da
AJE, distantes
de um mero
proselitismo
religioso),
quatro eventos
públicos
atraíram, em
média, duzentas
pessoas, de
diversos credos
religiosos. Os
números são
significativos,
sobretudo porque
as palestras e
seminários foram
realizados em
sábados pela
manhã. O público
principal,
formado por
alunos do Curso
de Direito, foi
fortemente
sensibilizado
pela qualidade
das reflexões
propostas. Os
temas envolveram
questões de
família, a ética
do advogado, os
horizontes
contemporâneos
da filosofia do
direito e o
preconceito
racial. O
acompanhamento
atento e as
indagações que
se seguiram
evidenciaram que
as sementes
foram lançadas
em solo fértil.
Os ambientes são
permeados de
assistência
espiritual
afinada com os
propósitos da
associação e o
público não
poderia ser mais
adequado. O
afluxo dos
acadêmicos de
Direito indica
que estamos no
caminho certo de
uma atuação
preventiva e de
formação dos
futuros
profissionais.
Mais do que
lutar pela
reforma das
estruturas
existentes, é
preciso mudar
mentalidades e
paradigmas dos
futuros
profissionais do
Direito.
Algo mais a
acrescentar?
Os Núcleos são
abertos a todos
os interessados,
inclusive
àqueles que não
são ligados à
área jurídica ou
não são
espíritas. O
sítio da AJE na
Internet (www.ajesaopaulo.com.br)
fornece
endereços
eletrônicos para
contato. Não há
qualquer custo
para a
participação nos
núcleos, nos
eventos ou para
a obtenção de
certificados
expedidos em
cada encontro. O
Núcleo de
Araraquara tem
reuniões
mensais, no
último sábado de
cada mês, no
prédio principal
da Uniara –
Centro
Universitário de
Araraquara. Além
da troca de
experiências
pessoais,
dedica-se,
atualmente, ao
estudo da obra
básica “O céu e
o inferno”, de
Allan Kardec,
cujo objeto é a
mais perfeita
das justiças: a
divina.