Almir, poderia
fazer-nos sua
apresentação?
Meu nome
completo é Almir
Del Prette,
nasci no ano de
1938 em Lins.
Meus pais
tiveram cinco
filhos, três
mulheres e dois
homens. Duas de
minhas irmãs, a
mais nova e a
mais velha, já
retornaram à
pátria
espiritual.
Minha mãe era
católica e meu
pai se dizia
esotérico.
Quando eu tinha
seis ou sete
anos, meus pais,
não sei bem a
razão, me
matricularam em
uma Escola
Adventista.
Acredito que
essa experiência
foi positiva,
pois realçou
mais ainda o
clima de
tolerância e
liberdade
religiosa que
tínhamos. E com
isso nunca me
esqueci de meu
primeiro
professor, cujo
nome era Abner
da Silva Ramos.
Devo mencionar
que meu avô
sempre morou
conosco e foi
muito
importante, pois
nos ajudou a
manter a família
estruturada,
principalmente
quando do
desencarne de
meus pais. Na
mocidade namorei
bastante, mas
esses
relacionamentos
não se firmavam
e somente me
casei aos 38
anos. Um fato
curioso é que,
pouco depois de
terminar a
faculdade de
Psicologia, com
boa chance de
trabalho onde
morava, tomei a
decisão de ir
para Londrina
onde conheci
Zilda que foi
minha aluna por
um semestre
letivo. Quando
ela terminou o
curso, começamos
a namorar,
casamos e
trabalhamos
juntos até hoje.
Temos dois
filhos: Lucas e
Giovana.
Lembro-me que
meus pais tinham
muitos livros e
eu queria lê-los
todos, mas minha
mãe selecionava
e dizia com que
idade eu poderia
ler algumas
obras. Vem dessa
época minha
paixão por
livros. Quando
eu tinha quase
dezoito anos
minha mãe ficou
muito doente,
vindo a
desencarnar
pouco depois.
Esse
acontecimento se
traduziu para
mim em uma
grande crise
religiosa que me
conduziu ao
materialismo
ingênuo
(descrença),
depois ao
marxismo
(leitura de O
Capital, o
estado como
superestrutura
etc.).
Qual sua
formação
acadêmica e
profissional?
Sou psicólogo e
professor.
Também fiz
pós-graduação,
mestrado e
doutorado.
Atualmente sou
aposentado, mas
continuo
trabalhando como
professor
voluntário, há
dezessete anos,
na mesma
Universidade em
que me
aposentei, a
Universidade
Federal de São
Carlos. Sou
pesquisador do
CNPq (Conselho
Nacional de
Pesquisa),
entidade
governamental,
da qual tive
bolsa de
pesquisador,
recentemente
renovada. Minha
área de
investigação tem
muita relação,
de um lado, com
minhas
preocupações
sociais (a
cultura, a
justiça social,
o
desenvolvimento
das sociedades)
e, de outro
lado, com o
interesse da
renovação
espiritual
(relações
interpessoais,
interação social
e habilidades
sociais).
Como você
conheceu o
Espiritismo e
desde quando é
espírita?
Quando eu tinha
quase dezoito
anos minha mãe
ficou muito
doente, vindo a
desencarnar
pouco depois.
Esse
acontecimento
resultou em uma
espécie de crise
religiosa que me
conduziu ao
materialismo.
Nesse período,
também adoeci e
estive
hospitalizado
por cerca de
dois anos.
Curiosamente, no
hospital
participei de
dois grupos
organizados. O
primeiro grupo
estudava o
marxismo e
atuava de
maneira
clandestina. Um
dos líderes
desse grupo era
também espírita
e isso me levou
ao segundo grupo
de internados
espíritas que se
reunia à noite,
no único local
disponível, uma
sala anexa ao
necrotério.
Dizia-se,
fazendo troça,
que era um bom
local para os
espíritas se
reunirem. Esse
aspecto meio
subversivo me
empolgou. Mas a
primeira vez que
fui à reunião
passei muito mal
e, segundo
alguém mais
conhecedor da
doutrina,
tratava-se de
mediunidade e da
ação de alguns
Espíritos que
pretendiam
atrapalhar
qualquer
possibilidade de
me recuperar
espiritualmente.
Alguns deles
ficaram por
perto durante
muito tempo, mas
tenho esperança
de que a maioria
já me desculpou.
Na terceira vez
que fui ao
“necrotério”,
conforme a gente
dizia, já estava
mais controlado
e ocorreu um
convite para uma
reunião que
espíritas da
cidade de Lins
iriam realizar
em um domingo
seguinte. Às
vésperas do
encontro eu não
estava nada bem,
mas tomei a
decisão de ir.
Essa reunião foi
um acontecimento
inesquecível
para mim, pois
representou uma
ruptura na
maioria das
minhas
concepções
equivocadas,
trazendo-me uma
ideia mais
correta da vida
e do Criador.
No horário
combinado, lá
estavam o senhor
Antonio Alfonso,
pai do Israel
Alfonso, Doutor
Otávio Noronha
Ribeiro e Maria
Eny Rossettini,
que ainda não
era casada. O
doutor Otávio
falou sobre a
evolução humana
na Terra e Maria
Eny relatou a
experiência de
André Luiz no
mundo espiritual
até a sua
aceitação em
Nosso Lar. Essa
tarde de domingo
marcou a minha
conversão ao
Espiritismo.
Ainda fiquei um
tempo no
hospital e
depois que
recebi alta
comecei a
participar do
movimento
espírita de Lins
e da região,
especialmente
das chamadas
“concentrações”,
onde conheci
Ismael, Aylton,
Ademar, César e
tantos outros
confrades. Isso
ocorreu
gradualmente,
pois
concomitante à
minha melhora
espiritual
ocorreu a
recuperação da
saúde física. Em
ambos os
processos foram
muitos os que me
ajudaram de
várias maneiras
e sou grato a
todos, mas
nomeá-los aqui
não seria
pertinente.
Poderia nos
descrever sua
trajetória pelo
Movimento
Espírita?
Minha trajetória
no movimento
espírita se
iniciou com a
frequência na
mocidade
espírita. Na
época, a maioria
das mocidades
não era autônoma
e funcionava
como
Departamento do
Centro. No caso
de Lins, o
regimento do
Centro previa um
mentor, sendo
nosso mentor,
durante muito
tempo, o Doutor
Otávio, com quem
os jovens
mantinham um bom
relacionamento.
Doutor Otávio
atuava em vários
setores,
inclusive na
Biblioteca, e me
orientou
bastante em
minhas leituras
espíritas. Algum
tempo depois,
começou a me
incentivar a
escrever, o que
vinha fazendo,
ajudando Maria
Eny na
organização de
apostilas para
cursos nas
confraternizações.
Logo que passei
a frequentar a
mocidade, fui
convidado pela
Maria Eny para
auxiliar na
Evangelização
Infantil, na
ocasião
coordenada pela
Dinah Castro.
Foi no trabalho
na Evangelização
Infantil que
descobri minha
vocação para o
magistério,
atividade que
mantenho até
hoje.
Simultaneamente,
lá pelos idos de
68, comecei a
participar dos
Cursos de
Dirigentes de
Mocidade
Espírita, com
Israel Alfonso,
Aylton Paiva,
Cláudio de
Mauro, Maridélia
e outros sob a
liderança da
Maria Eny. O
Abel Glaser
também
participava e
tinha um papel
importante,
pois, de certa
maneira, dava
respaldo
institucional
àquele
movimento. Não
se pode esquecer
que o país
vivia, no campo
da política, os
anos de chumbo e
precisávamos ter
muito cuidado e
prudência, Esse
foi um período
muito bom, de
muita leitura,
discussão e
aprendizagem. No
período de minha
formação
universitária,
em Bauru,
diminuí bastante
minha
participação no
movimento
espírita, mas,
curiosamente, em
nossa sala
tínhamos quatro
espíritas. Na
formatura, esse
grupinho, com
apoio de colegas
simpatizantes,
realizou um
culto ecumênico
com um padre, um
pastor e um
orador espírita,
o Ademar
Previdello.
Outra
experiência
importante
naquela época
foi eu ter
trabalhado,
durante pouco
mais de dois
anos, como
funcionário em
um Hospital
Psiquiátrico
Espírita.
E no trabalho de
Unificação?
Minha
participação na
Unificação foi
bastante
restrita e
ocorreu
esporadicamente,
quase sempre
graças aos
convites do
Aylton Paiva,
após nosso
retorno de João
Pessoa para
morar no estado
de São Paulo,
primeiramente em
Ribeirão Preto e
depois em São
Carlos, onde
estamos até
hoje.
A que
casa espírita
está vinculado
presentemente e
quais os
trabalhos que
nela desenvolve?
Estou vinculado,
desde que
cheguei a São
Carlos, à
Sociedade
Espírita
Obreiros do Bem
(SEOB), mas
participo,
principalmente
como
palestrante, em
outros Centros,
em especial no
Batuíra. Já
participei da
diretoria e do
conselho fiscal,
mas atuo com
mais frequência,
juntamente com
Zilda, dando
cursos.
Como está o
movimento
espírita em São
Carlos?
Minha impressão
é bem positiva.
O movimento
espírita de São
Carlos tem uma
característica
interessante.
São Carlos tem
cerca de 250 mil
habitantes e
conta com duas
grandes
universidades
públicas (USP e
Federal), então
há muita gente
que vem para cá
para estudar,
frequenta os
Centros apenas
durante alguns
anos e depois
retorna à sua
cidade de
origem. Dona
Neide, esposa do
senhor Apolo
Oliva, costumava
dizer que nossa
vocação era a de
ajudar na
preparação
desses jovens
estudantes para
eles retornarem
às suas cidades,
e se firmarem em
seus Centros de
origem.
Ultimamente, a
SEOB vem
apoiando de
diversas
maneiras a
organização e
funcionamento de
Centros
Espíritas em
bairros
periféricos.
Acha que esse
movimento vai
bem pelo Brasil
e pelo mundo?
Não saberia
fazer uma
análise da
abrangência do
movimento
espírita. A
impressão que
tenho é que
hoje, tanto pela
rapidez dos
meios de
comunicação,
como pela
facilidade de
deslocamento, há
uma maior
possibilidade de
divulgação. Acho
que este é o
momento de
colocar a
candeia bem
visível. O que
vi em algumas
partes da Europa
pode ser
interpretado
como um
descontentamento
com a religião,
que se reflete,
na atualidade,
no movimento
ateísta.
Aparentemente
devido ao
desinteresse
religioso, as
igrejas
diminuíram seus
espaços para a
prática
religiosa e
aumentaram a
parte destinada
ao turismo. Eu
penso que a
própria religião
é responsável
por esse
desinteresse. É
comum se
observar, no
meio
universitário,
as brincadeiras
sobre as
principais
doutrinas
religiosas,
todavia os
estudantes têm
sede de
conhecimento,
derivado de
análise lógica.
Só para
exemplificar,
certa vez fomos
convidados por
estudantes de
uma Universidade
Pública para
darmos um curso
sobre
Habilidades
Sociais (tema
que estudamos),
Religião e
Ética. A maioria
dos presentes
disse não
frequentar
nenhum
agrupamento
religioso, mas
todos estavam
ali por
interesse no
assunto. Logo ao
iniciarmos o
curso, expusemos
aos alunos o
nosso viés, ou
seja, iríamos
falar na
perspectiva de
quem aceita a
noção de um
criador para o
universo, ainda
que não a de um
Deus criado à
nossa imagem e
semelhança.
Verificamos que
no grupo de
alunos, quase
uma centena, a
maioria era
ateísta, mas
tudo transcorreu
muito bem, com
diálogo
respeitoso. Ao
final, muitos
vieram nos
cumprimentar e
três jovens se
revelaram como
espíritas.
Quais falhas
você enxerga e o
que precisa ser
corrigido?
Como minha
participação não
é tão intensa
quanto eu
gostaria, não me
sinto capaz de
uma análise mais
profunda. De
qualquer
maneira, recorro
a Kardec que
identificava a
missão do
Espiritismo como
um recurso
importante no
combate ao
egoísmo e ao
materialismo.
Tendo em vista
esse desencanto
com a religião,
o movimento
espírita deveria
enfatizar as
principais
diferenças da
doutrina
espírita em
relação à
teologia
tradicional,
pois o deus
bíblico
justifica o
crescimento do
materialismo e
do ateísmo.
Outro aspecto
que considero
muito importante
diz respeito ao
materialismo e,
especificamente,
ao movimento
ateísta. A
maioria dos que
se dizem ateus
não querem mais
viver na ilusão,
não aceitam um
“deus menor”. E
temos que
concordar que
eles têm razão
nesse ponto. A
humanidade,
ainda na sua
infância, fez
uma pergunta
equivocada:
“quem é Deus?”.
A resposta a
essa pergunta
trouxe o que
temos por aí.
Precisamos
analisar esse
equívoco com a
alternativa que
Kardec colocou:
“O que é Deus”?
Finalmente,
tanto ou mais
desastroso que o
materialismo
científico é o
materialismo
religioso. Este
está em toda
parte, solapa a
boa intenção,
subverte a
verdade e mina o
esforço do
progresso da
humanidade. A
maioria de nós
que tem
interesse pela
transcendência
ajudou a forjar
esse deus menor
e a inculcar na
mente humana
essa
representação da
divindade,
cabe-nos então a
tarefa de
restituir à
verdade, a
começar em nós
mesmos.
Tem alguma obra
escrita?
Zilda e eu
publicamos
alguns livros na
área em que
trabalhamos: a
do
relacionamento
interpessoal.
Temos um site: www.rihs.ufscar.br que
divulga teses,
artigos, livros,
eventos do nosso
grupo de
pesquisa.
De que elas
tratam?
A maioria
focaliza o tema
relações
interpessoais e
áreas afins.
Temos até um
livro dedicado à
infância: “Já
pensou se todo
mundo torcesse
pelo mesmo
time?”. Contudo,
entre os nossos
trabalhos temos
um livro,
“Habilidades
Sociais - O
Modelo de
Jesus”, editado
pela Vozes, que
focaliza a
competência
interpessoal de
Jesus. Acredito
que fomos
inspirados na
execução dessa
obra. O original
foi submetido a
líderes
católicos,
protestantes e
espíritas com a
solicitação de
que anotassem
qualquer ideia
que poderia
contrariar a
doutrina que
professavam.
Isto porque
queríamos um
livro que
focasse os
comportamentos
de Jesus, mas
sem nenhuma
conotação
doutrinária ou
teológica. Em
outras palavras,
diante de
inúmeras
situações (no
templo, na rua,
no casamento, na
família, no
tribunal etc.) e
diferentes
pessoas (pobre,
rico, fariseu,
mulher,
discípulo,
enfermo,
autoridade
etc.), nosso
interesse recai
em como Jesus se
comportava. O
resultado desse
trabalho tem
sido muito
compensador.
Temos recebido
cartas de
pastores,
líderes
católicos,
colegas que têm
adotado o livro
como referência
em cursos e/ou
atividades
pastorais.
Recentemente,
minha cunhada,
que é católica e
participa de um
grupo de estudo
ecumênico, nos
relatou muito
feliz que o
assunto em
discussão havia
sido transcrito
desse livro, que
já foi
reeditado.
Tem saído para
fazer palestras
em outras
cidades?
Raramente tenho
feito palestras
fora da cidade
de São Carlos.
Preferimos
aceitar convites
para cursos que
entendemos poder
oferecer uma
colaboração mais
efetiva dentro
de nossos
recursos.
Como pode ser
contatado?
Além do nosso
site (acima
citado), meu
endereço é: adprette@ufscar.br.
Algo mais que
queira
acrescentar?
Agradecer esta
oportunidade que
você me
possibilitou,
agradecer a
paciência dos
leitores e
também agradecer
aos Espíritos
amigos que nos
auxiliam em
nossa renovação
espiritual.
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